Jovem que foi recrutado pelo tráfico não deve ser punido, diz desembargador

goo.gl/QQ64gE | O adolescente marginalizado que atua no tráfico de drogas não pode ser punido, pois o Brasil assinou um pacto internacional que reconhece a prática como exploração de trabalho infantil. Assim, ao determinar sua punição, a Justiça trataria o jovem como autor e vítima ao mesmo tempo, de forma contraditória.

Esse foi o entendimento do desembargador Siro Darlan de Oliveira, da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao votar por liberar um adolescente apreendido com 665 gramas de maconha, dividida em blocos. A tese foi vencida, pois os demais colegas do colegiado concluíram que o jovem deve responder pelo ato, em semiliberdade.

Em primeiro grau, o juízo havia associado a conduta do rapaz ao tráfico de drogas, conforme o artigo 33 da Lei 11.343/06, determinando que ele ficasse internado em unidade socieoeducativa. A defesa recorreu, e Darlan de Oliveira afirmou que o caso exigia a análise sobre o conceito de ato infracional fixado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

“Se a ação cometida pelo adolescente, embora típica e antijurídica, por ausência de elementos constitutivos do conceito de culpabilidade não for reprovável, ao adolescente não se lhe poderá impor medida socioeducativa”, disse o relator.

Ele apontou que a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho classifica como uma das “piores formas de trabalho infantil” o recrutamento de crianças para atividades ilícitas, “em particular a produção e o tráfico de entorpecentes”. A regra, promulgada no Brasil pelo Decreto 3.597/2000, estipulou obrigações para os países signatários, como medidas de proteção às vítimas, e não sanções criminais contra elas.

“Para esta parcela marginalizada pelas mazelas sociais e econômicas em nosso país no tocante aos infantes em nosso país, exige-se o estudo da divisão da culpa entre o agente infrator e o Estado que se omite perante a imposição constitucional da proteção integral dos direitos das crianças e dos adolescente”, concluiu Oliveira, citando ainda que o Brasil seguiu a Convenção sobre Direitos da Criança da ONU de 1989 ao sancionar o ECA.

“A conduta típica é aquela que reúne todos (ou parte no caso de delitos tentados) os elementos de determinada norma incriminadora”, escreveu o desembargador. “Assim, o princípio da culpabilidade, entendido no sentido político-criminal (ou seja: como normal capacidade do agente de motivação de acordo com a norma), impede que o autor de um fato punível seja efetivamente punido quando concorram determinadas condições psíquicas, pessoais ou situacionais que lhe impossibilitam o normal acesso à proibição.”

Casos diferentes

Para Siro Darlan, cabe ao juiz analisar cada caso concreto separadamente, levando em conta a situação do jovem e o nexo de causalidade entre sua perspectiva de vida e a infração cometida, além da “influência da marginalização que foi proporcionado pelo próprio Estado”.

Ele entendeu ainda que apenas “uma interpretação desavisada da legislação infantojuvenil” pode concluir que a privação de liberdade seria adequada para retirar os jovens do trabalho no tráfico, pois interná-los consiste em “autênticas sanções penais juvenis, de sorte que [essa ideia] deve ser veementemente rechaçada”.

A desembargadora Maria Angélica Guedes abriu divergência, vencendo por maioria de votos. A câmara aplicou a medida de semiliberdade. A justificativa deve ser registrada no acórdão, que ainda não foi publicado.

Clique aqui para ler o voto do relator.

Por Felipe Luchete
Fonte: Conjur

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