Para sindicato de advogados, audiência de custódia dá muitos direitos a presos

goo.gl/7jE1EX | Incomodado com a implantação das audiências de custódia, o Sindicato dos Advogados da Paraíba quer que o Supremo Tribunal Federal suspenda em todo o país a iniciativa, que garante ao preso em flagrante o direito de ser ouvido por um juiz em até 24 horas. O objetivo é até conseguir liminar diante da “soltura de centenas de milhares de marginais”.

A entidade considera que a norma administrativa que regula as audiências, fixada pelo Conselho Nacional de Justiça, erra ao permitir que o preso exerça o direito ao silêncio. “Se a permanência em silêncio é regra, para que serve a audiência? É uma incógnita a resposta”, diz a petição do mandado de segurança.

A Resolução 2013/2015 determina que juízes questionem se o preso teve respeitado direitos como consultar advogado ou defensor público e se comunicar com familiares. O sindicato, porém, é contra essa previsão: “esses mesmos direitos foram subtraídos da vítima, que em casos de homicídio não vai poder se comunicar com mais ninguém”.

Embora o STF tenha súmula vinculante que só permite algemas em situações excepcionais, o sindicato define como “absurdo” dispositivo da resolução que impede pessoas algemadas durante o encontro, exceto em casos de resistência, de fundado receio de fuga ou de perigo à própria integridade física ou de terceiros.

“A algema passa a ser exceção e não regra, pondo em risco todo um sistema de segurança pública em benefício de bandidos presos em flagrante”, lamenta a entidade, em peça assinada por seu presidente-adjunto, Jocélio Jairo Vieira.

O sindicato, mesmo sendo de advogados, parece não gostar também da obrigação de que autoridades, ao prenderem alguém em flagrante, leiam os direitos do detido.

Incomoda ainda o fato de as audiências de custódia servirem para verificar as condições em que a prisão ocorreu, sem tratar de como o crime foi praticado, mesmo essa segunda parte sendo obrigação do juízo criminal que analisará o caso.

“A preocupação da autoridade coatora foi de apenas e tão somente levar o preso à presença do magistrado para que ele seja, pasme Vossa Excelência, ouvido sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão. Note-se que a ida até a presença do juiz não tem o objetivo de ouvir o preso sobre as circunstâncias do crime que praticou, mas sobre o como o bandido foi tratado no ato da prisão”, lamenta.

Ainda segundo o sindicato paraibano, fazer o juiz indagar sobre as circunstâncias da prisão “lança uma suspeita infundada sobre a prisão, como se as autoridades responsáveis pela prisão ou apreensão não fossem capazes de seguir as normas legais e constitucionais atinentes”.

Vieira afirma ainda serem falsas as denúncias de que criminosos presos sofrem abusos pelas autoridades e sugere que, se essa proteção ao detido for mantida, que se pergunte ao acusado — sem contraditório e ampla defesa, por se tratar de audiência de custódia — como ele tratou a vítima, se deu a ela o direito de se defender ou se a torturou.

“A referida resolução não permite que se pergunte sobre os fatos que constituem o crime em si, enquanto se preocupa demais com a integridade física e psicológica do autor do fato delituoso. É sim uma inversão de valores, ao tempo em que não se fala em nenhum momento sobre a vítima e seus familiares, visto que, não há preocupação do Estado para com elas”, afirma o sindicato.

Também angustia o autor o fato de muitos dos presos levados ao juízo para audiência de custódia serem soltos, por falta de razões para fixar prisão preventiva ou substituição por outras medidas cautelares. O presidente diz que essas solturas são “um exemplo clássico da impertinência” da iniciativa.

O mandado de segurança está sob a relatoria da ministra Rosa Weber.

Falta de previsão

O sindicato argumenta também a inexistência de previsão legal para as audiências de custódia. Diz Vieira que o CNJ está legislando em matéria processual penal porque as prisões em flagrante são regidas pelos artigos 301, 302 e 303 do Código de Processo Penal — que nada citam sobre as audiências.

“O artigo 8º da Resolução da Presidência do Conselho Nacional de Justiça 213, de 15.12.2015, traz em seu bojo a mais dinâmica e antijurídica inversão dos valores morais da sociedade, quando estabelece que na ‘audiência de custódia, a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante’, quando o termo técnico e jurídico seria interrogatório e não entrevista”, reclama Vieira.

Em 2015, STF já decidiu norma administrativa do Judiciário paulista sobre o tema apenas disciplinou direitos fundamentais do preso já citados no CPP e seguiu a Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, que entrou no ordenamento jurídico brasileiro em 1992. Em seu artigo 7º, inciso 5º, o documento estabelece que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”.

Entendimento contrário

Advogados e juristas consultados pela ConJur se disseram surpresos com os argumentos usados na peça e com a natureza do autor do pedido. “É como os médicos reclamando que remédio está curando doentes em demasia”, diz o jurista Lenio Streck, colunista da revista eletrônica.

Ao criticar a proposta, a seccional paraibana da Ordem dos Advogados do Brasil destacou que a previsão para audiências custódia existe no ordenamento jurídico brasileiro por conta da internalização do Pacto de San José da Costa Rica.

A OAB-PB lembrou também do déficit de aproximadamente 244 mil vagas no sistema penitenciário brasileiro. “O advento das audiências de custódia é extremamente bem-vindo não apenas no ordenamento jurídico brasileiro como no sistema penitenciário, podendo diminuir significativamente as distorções existente por ocasião das prisões, fazendo cair os números de presos provisórios e de prisões ilegais”, afirmou.

O professor Fernando Castelo Branco, diretor do Cesa (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados), afirma que a ação movida pelo sindicato não foi feita para "buscar um fim social". Segundo ele, o pedido ao Supremo "é de uma leviandade" que faz com que seja difícil acreditar nos argumentos.

"É triste saber que isso tenha saído da cabeça de um advogado", afirma Castello Branco, que leciona Processo Penal na PUC-SP e coordena a pós-graduação em Direito Penal Econômico no IDP. Ele entende também que a audiência de custódia é uma garantia legal de que o juiz analisará a prisão em flagrante.

"Nossa Constituição, quando destaca o direito à vida e à liberdade, mostra que a prisão é efetivamente uma exceção. Sendo assim, ela deve estar absolutamente regrada para os casos em que ela é necessária. Como a prisão em flagrante destoa de todas as outras modalidades porque dispensa mandado de prisão, é natural que a autoridade judicial analise se a prisão foi efetivamente regular."

Clique aqui para ler a inicial.
MS 35.477

Por Brenno Grillo
Fonte: Conjur

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