Animais como entretenimento: o lado perverso do divertimento humano; vídeo

goo.gl/tttsP6 | No dia 15 de abril de 2018 foram divulgadas pelo mundo todo as imagens de um urso – animal que é símbolo da Rússia – chamado Tim. Durante um jogo de futebol da terceira divisão russa, o urso, controlado por um domador e usando uma focinheira, posicionou-se à frente do gramado. Movimentou as mãos como se estivesse batendo palmas, segurou a bola e a entregou ao árbitro da partida.



Obviamente, se pudesse escolher, esse animal não estaria lá, contrariando todos os comportamentos naturais de sua espécie, obedecendo comandos. Obediência obtida através de treinamentos humilhantes, pois “espancamentos, choques elétricos e privação de comida são métodos usados pelos tratadores russos para fazer com que os ursos realizem truques depreciativos e estúpidos”, disse Mimi Bekcechi, chefe de campanhas da People for the Ethical Treatment of Animals (PETA), na Austrália.

Essa exibição é mais um exemplo de exploração animal cujo objetivo é o entretenimento do ser humano. “Os ursos são animais selvagens e, como tal, têm necessidades muito específicas e complexas. Ser amordaçado e forçado a realizar atos antinaturais na frente de grandes multidões de pessoas causa tremendo estresse e pode ter um impacto incalculável sobre esses animais, tanto psicológicos quanto físicos”, afirma Elisa Allen, da PETA/UK.

Devem ser citadas também as rinhas de galo e de cães, práticas cruéis cujos maus-tratos iniciam-se muito antes de os animais entrarem nas arenas.  A preparação dos cães para rinhas nos EUA era composta de treinamentos dolorosos, como eletrochoques, explosões de pólvora perto da cabeça dos animais, pimenta e alimentação com altas doses proteicas.

Atualmente, os treinamentos também incluem maus-tratos, como espancamento. Quanto aos galos, são cortadas cristas e barbelas; o bico e as esporas são reforçados com aço inoxidável e, quando não estão em “treinamento”, são mantidos em minúsculas gaiolas para atuar num combate que só termina com a exaustão ou a morte de um dos competidores.

No Brasil, apesar das proibições, as rinhas seguem acontecendo na clandestinidade. E, novamente, para entretenimento do homem.

A vaquejada, o rodeio e expressões artístico-culturais similares ganharam o status de manifestações da cultura brasileira e foram elevadas à condição de patrimônio cultural imaterial do país, estabelecida pela Lei nº 13.364/2016. Além da vaquejada e do rodeio, a lei estabelece como patrimônio cultural imaterial do Brasil atividades como as montarias, provas de laço, apartação e provas de rédeas.

Já a chamada “farra do boi”, continua a ocorrer, apesar de proibida em todo o estado de Santa Catarina desde 1997 por meio do Recurso Extraordinário nº 153.531, do Supremo Tribunal Federal. O boi é perseguido por uma multidão entre ruas de cidades e vilarejos, em matas e praias. É provocado e agredido com pedradas e pauladas, numa barbárie que pode durar dias, até, geralmente, ser morto e ter sua carne distribuída entre os “farristas”. Isso é divertido? Não para o animal!

As touradas, por sua vez, fazem parte da cultura de países como França, Espanha e Portugal, apresentando também várias situações de maus-tratos cometidas contra os touros. Além das touradas, na Espanha, mais especificamente no município de Medinaceli, ocorre a celebração chamada Touro de Fogo no segundo sábado de novembro.

Segundo Soldera, “durante cerca de 23 horas, como em todos os anos, um grupo de jovens locais agarra um touro em nome da tradição” e coloca duas bolas em seus chifres, ateando fogo logo a seguir. Então, soltam o touro que, aterrorizado, se contorce com os “olhos abrasados pelo calor das chamas e dos pedaços de brasa que saltam das coroa de espinhos que lhe colocaram”. Após horas de sofrimento agoniza até a morte, sendo que essa tortura, assistida por espectadores que aplaudem entusiasmados, é financiada pelos governantes do município.

E os circos? Tom Regan os considera uma das facetas mais perversas de crueldade, onde os animais são explorados para o divertimento humano. Acentua a privação sistemática a qual esses seres são sujeitados pela absurda limitação de espaço e espancamentos por parte de seus tratadores, ocasionando grave desestruturação social e severas anormalidades comportamentais nesses animais.

Regan comparou as condições de vida dos animais de circo às dos criminosos atrás das grades. No Brasil, alguns estados (Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina, entre outros) já sancionaram leis que proíbem a utilização de animais em circos.

Regan também afirma que “somente quando todos os animais que ‘apresentam números’ estiverem livres é que haverá justiça”. E, ao se perceber o sucesso estrondoso do Cirque du Soleil, fundado no Canadá em 1984 e que não usa animais em suas apresentações, compreende-se que não há mais justificativa para a utilização de animais em circos.

Para concluir, e voltando ao urso da Rússia, afirmo que o animal não é um tolo, repetindo ações para os quais fora treinado. Ele foi obrigado a isso. Nós, seres humanos, que precisamos nos conscientizar que os animais não são objetos de entretenimento.

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REFERÊNCIAS


BBC SPORT. Performing bear at Russian match is ‘inhumane’ – animal welfare groups. 2018. Disponível aqui. Acesso em: 26 abr. 2018.

BONGIOLO, Fernando. Consequência jurídico criminais da farra do boi em Santa Catarina. 2007. Disponível aqui. Acesso em: 25 abr. 2018.

REGAN, Tom. Jaulas vazias: encarando o desfio dos direitos animais. Tradução de Regina Rheda. Porto Alegre: Lugano, 2006.

SOLDERA, Raquel. Touros são torturados e têm seus chifres queimados em festa espanhola. 2009. Disponível aqui. Acesso em: 30 jun. 2017.

USO de urso em abertura de jogo na Rússia é condenado por ambientalistas. 2018. Entretenimento. Disponível aqui. Acesso em: 25 abr. 2018.

Por Gisele Kronhardt Scheffer - Mestranda em Direito Animal. Especialista em Farmacologia. Médica Veterinária.
Fonte: Canal Ciências Criminais

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