Sem permissão é estupro, alerta Conselho da Mulher em resposta a desembargador

goo.gl/jBgy2w | O Conselho Estadual dos Direitos da Mulher se diz estarrecido com os motivos apresentados oralmente pelo desembargador Marcos Machado do Tribunal de Justiça, na quarta (23), ao pedir de vista de um recurso que busca a soltura de W. P. G., 33 anos. W. é suspeito do estuprar a estudante L. G. C., 30, enquanto ela dormia, após ter ingerido bebida alcoólica em uma festa, em uma residência no bairro Boa Esperança, em Cuiabá. “Senhor Desembargador: A culpa nunca é da vítima”, declara o Conselho. O desembargador alega que foi mal interpretado.

Em sessão no TJ, o desembargador havia dito que “[...] com a devida vênia, a embriaguez voluntária, me parece claro. Uma mulher madura, 30 anos, nós não temos aí essa ingenuidade, essa dificuldade, inclusive de ingerir a bebida. Se é fato verdadeiro que houve um relacionamento sexual antecedente então eu já não identifico o fato criminoso em si [...]”, comentou Marcos Machado na referida sessão.
A culpa nunca é da vítima - diz trecho da nota”
Por meio de nota, o Conselho pondera que, independente do mérito do recurso colocado em julgamento, e respeitando o direito ao livre convencimento do magistrado e seu entendimento técnico, se sente na obrigação de se manifestar, pois considera que as palavras de uma autoridade pública “podem ter repercussão social contrária ao trabalho de conscientização que tantas instituições, cidadãs e cidadãos desenvolvem em relação à cultura do estupro”.

O Conselho enfatiza que o fato da vítima ter ingerido bebida alcoólica jamais pode ser confundido com uma autorização tácita, ou seja, subentendida. “Se a pessoa se encontra embriagada ou intoxicada, especialmente ao ponto de inconsciência, se está diante de sexo não consentido: é estupro”.

A entidade afirma também que o fato da vítima ter mantido relacionamento sexual anterior com o suposto agressor, não lhe dá permissão para sexo futuro, inclusive dentro de um casamento. Nesta linha, assevera que sexo não consentido com pessoa inconsciente é estupro de vulnerável. “Esperamos que o voto a ser proferido, após o pedido de vistas, considere os aspectos técnicos contidos no processo (testemunhas, etc). E solicitamos para que o Poder Judiciário não transmita a mensagem aos jovens de que uma mulher sempre está disponível para sexo, independente de seu consentimento, por ter ingerido bebida alcoólica”, conclui a nota.

Com relação à nota, Marcos Machado diz respeitar toda e qualquer manifestação de pensamento, especialmente de entidades e movimentos sociais, por acreditar na importância do controle social exercido por segmentos da sociedade civil para a coletividade.

O magistrado acredita não ter sido compreendido por má ou incompleta verbalização do pedido de vista dos autos, ao visualizar que cabia a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares alternativas. Neste sentido, diz ter aceito com humildade a crítica, que o levará a redobrar seu cuidado para analisar o caso. “Não obstante, consigno que jamais julguei crimes de estupro sem valorizar a versão da vítima, ao contrário, a palavra da vítima sempre foi prevalente”, ressalta ao afirmar que nunca relativizou os direitos da mulher, em especial à sua dignidade e intimidade.

Esclarecimento


Em resposta à matéria veiculada pelo rdnews sobre o julgamento em que essa fala foi proferida, o desembargador entrou em contato com a reportagem com o intuito de esclarecer que apenas expressou “um juízo aparente, como hipótese possível a ser analisada, para motivar pedido de vista dos autos e me permitir o estudo do fato, com base tão somente no voto do desembargador-relator e na sustentação oral da Defesa”.
Jamais julguei crimes de estupro sem valorizar a versão da vítima - diz Machado”
Nesta linha, o desembargador explica que num julgamento colegiado de um processo eletrônico, que é o caso, apenas o desembargador-relator tem acesso às provas e informações sobre o fato denunciado, de modo que os demais desembargadores membros daquele colegiado têm a possibilidade de formular suas opiniões com base no que ouviram ou pedir vista dos autos para ter acesso a todas as provas. Foi isso que Marcos Machado fez. Seu voto definitivo, se será soltura ou manutenção da prisão preventiva do suspeito deve ser lido na sessão da próxima quarta (30).

Marcos Machado também ressalta que não havia denúncia, ou seja, a acusação formal do Ministério Público Estadual sobre o caso, mas apenas as versões da suposta vítima e do suposto estuprador. “[...] as quais precisam ser avaliadas porque, segundo a defesa, ambos se conheciam, tiveram relação sexual, teriam (ambos) ingerido muita bebida alcoólica numa confraternização”, argumenta o magistrado.

O desembargador cita que essas circunstâncias poderiam e podem confrontar a violência presumida, além do fato de a vitima estar distante das testemunhas no momento em que o estupro teria ocorrido. Ele pontua, ainda, que o recurso não discute a existência ou não do fato.

Por Eduarda Fernandes
Fonte: www.rdnews.com.br

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