Já é uma tradição antiga que, quando duas pessoas se casam, a mulher assuma o sobrenome do marido.
As tradições variam muito de lugar para lugar, mas normalmente a mulher acrescenta o nome de família do pai de seu marido ao final do seu nome. Com a evolução da sociedade, e um novo papel da mulher, essa tradição deixou de ser considerada obrigatória (inclusive na lei), sendo muitos os casos em que ambos os cônjuges mantêm seus nomes depois de casados. Com o novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002), passou-se a aceitar outra possibilidade ainda: a do homem acrescentar o sobrenome da mulher, conforme o art. 1.565, §1º. Tenho visto vários casos em que isso acontece ou aconteceu (inclusive meu caso foi assim). Muitos já ouviram falar de casos de homens que assumem o nome de família da mulher, ou noivas que adotam o sobrenome da sogra e não do sogro, por ser uma família mais conhecida ou tradicional.Quanto às crianças, no Brasil, nossa tradição é de batizá-las com o nome de família do pai no fim. José da Silva Santos, por exemplo; a família do pai do José é a família Santos, e a família da mãe dele é a família da Silva. A lei de registros públicos (Lei nº. 6.015, de 31 de dezembro de 1973) estabelece como regra apenas que o declarante do nascimento deve indicar o nome da criança e, se não declarar um nome completo, o oficial de registro deverá acrescentar o sobrenome do pai ou da mãe.
Todas essas regras (tradições ou leis) têm por objetivo facilitar a identificação das pessoas pelo nome. Antonia Andrade Almeida, por exemplo; sabemos que ela não é a Antonia Bernardes, filha de Carlos Bernardes. Mas é a Antonia filha do Sr. Almeida e da Sra. Andrade, ou é a filha do Sr. Andrade que casou depois com o Sr. Almeida, ou ...?
A história fica mais complicada quando o casal se separa; em alguns casos, por exemplo, o ex-marido (Fábio Gomes Horta) está registrado como tendo o nome da ex-mulher (Isabel Horta). Talvez ele não queira manter o nome, se a separação não foi amigável, por exemplo. Ele é obrigado a mantê-lo ou pode voltar a usar o nome de solteiro (Fábio Gomes)?
Outro exemplo: Antonia Bernardes adotou o nome do marido, Carlos Dias, com o casamento, passando a se chamar Antonia Bernardes Dias. Teve um filho com ele, que batizaram com o nome Eduardo Dias. Se houver separação, Antonia pode continuar a se chamar Bernardes Dias, para que ela e o filho mantenham o mesmo sobrenome? Mas suponha que Carlos Dias seja um grande político, artista ou playboy, e não queira que Antonia seja associada a seu nome depois da separação (talvez tenha havido um flagrante de adultério, por exemplo, gerando publicidade negativa a Carlos). Carlos pode exigir que Antonia volte a se chamar apenas Antonia Bernardes, mesmo com a questão do filho?
O Código Civil resolve algumas dessas questões. O art. 1571, §2º, estabelece que no divórcio direto consensual (quando houve separação "na prática" por mais de dois anos, e mediante pedido dos cônjuges de forma amigável) é permitida a utilização do nome de casado/casada, caso seja decidida por cada um dos (ex-) cônjuges.
O mesmo parágrafo estabelece que no divórcio que se originou da conversão de separação judicial (ou seja, quando os cônjuges pedem primeiro a separação judicial para o juiz, e depois de um ano pedem para que essa separação se converta em divórcio), há a opção por usar o nome de casado somente se a sentença da separação judicial não indicar o contrário. Isso acontece normalmente em separações não-amigáveis.
Já o artigo 1.578 aborda especificamente esse caso (separação não-amigável):
Art. 1.578. O cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar:
I - evidente prejuízo para a sua identificação;
II - manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida;
III - dano grave reconhecido na decisão judicial.
§ 1º O cônjuge inocente na ação de separação judicial poderá renunciar, a qualquer momento, ao direito de usar o sobrenome do outro.
§ 2º Nos demais casos, caberá a opção pela conservação do nome de casado.
Ou seja, se houver separação "com briga", aquele que "tem razão", na decisão do juiz, tem a opção de manter ou não o nome de casado (§1º).
Aquele que "não tem razão" (por ter cometido adultério ou abandonado o lar, por exemplo), não tem opção, ficando sujeito à vontade do cônjuge inocente: se for requerido por este, o culpado da separação é obrigado a deixar de usar o nome de casado.
Também se ressalta que não há situação que obrigue ninguém a continuar usando o nome de casado; isso é um direito que pode ou não ser perdido.
Com base nessas informações, creio que já é possível analisar os casos de Fábio Gomes Horta e Antonia Bernardes Dias. Qual é a sua opinião sobre os dois casos? Use a ferramenta de comentários deste site para colocar sua resposta.
Por Alberto Lopes - Engenheiro, professor, aluno de Direito da USP
Fonte: Direito Diário (disponível em http://direitodiario.blogspot.com)