Velocidade processual é o bom exemplo do juiz federal Sérgio Moro e da operação 'lava jato'

http://goo.gl/6j4SBT | Em agosto, quando advogados, juízes e membros do Ministério Público que participaram de um seminário de ciências criminais em São Paulo,  sentaram-se para almoçar, chamou a atenção um notebook aberto sobre a mesa. De frente para a tela, Sergio Fernando Moro, que palestrou no evento, trabalhava nos processos da famigerada operação "lava jato" — duramente criticada por diversos advogados do local.

O mérito das decisões tem sido contestado em diversas oportunidades, mas a rapidez com a qual os processos relacionados à operação estão andando é elogiada até pelos criminalistas que recorrem contra as sentenças. Ou seja: apesar do conteúdo, a forma serve como bom exemplo.

A quantidade de notícias e informações publicadas na imprensa sobre a megaoperação “lava jato”, que investiga corrupção na Petrobras, faz o leitor imaginar pilhas de papéis com depoimentos de delatores, relatos de quebra de sigilo, anexos de contas no exterior e petições de advogados na mesa do juiz. Mas o caso que há 19 meses estampa manchetes de jornais ocupa pouco espaço da 13ª Vara Federal de Curitiba, mobilizando cerca de 15 servidores e um único juiz.

As 31 ações penais e todos os inquéritos em andamento são 100% digitais. Advogados e imprensa recebem senhas para consultar os autos em sistema eletrônico, encontrando ali cada capítulo sobre os relatos de corrupção que começaram citando um grupo de doleiros, apontaram fraudes em licitações de obras da Petrobras e agora chegam a outros contratos em estatais e na Administração Pública. Um ou outro documento fica de fora da plataforma, geralmente quando a parte tem dificuldade em digitalizar materiais volumosos.

O que garante o andamento da ação é que, desde fevereiro, nenhum processo sobre outro assunto entra na vara. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região suspendeu novas distribuições, exceto em questões ligadas a processos conexos ou em que a vara é preventa. A presidência da corte aceitou requerimento de um grupo de juízes criminais de Curitiba. A medida valia a princípio por 90 dias e, com duas renovações, completou o 250º dia neste mês.

Assim, em setembro de 2015 chegaram 58 processos à 13ª Vara Federal, enquanto para as vizinhas 12ª e 14ª (também criminais) foram distribuídos, no mesmo período 136 e 144 ações, respectivamente. Segundo o TRF-4, é a segunda vez que o tribunal toma esse tipo de atitude: o único caso anterior foi em 2008, na 3ª Vara Federal de Santa Maria (RS), quando a ex-governadora gaúcha Yeda Crusius (PSDB) foi acusada de supostas fraudes na contratação de empresas prestadoras de serviços ao Detran-RS.

Advogados e juízes dizem que o modelo adotado imprimiu um bom ritmo à "lava jato", mas mostrou como a Justiça é falha em todos os outros processos. Para resolver o problema da morosidade, brincava um criminalista, em um restaurante onde se reunia nata da advocacia paulista nesta quarta-feira (28/10), "basta que sigamos esse exemplo, e cada juiz cuide de apenas um caso". "E que todos tenham o Ministério Público falando exatamente o que eles querem ouvir", emendou outro advogado.

Rotina

No total, a 13ª Vara tem 982 processos em tramitação e 1.722 em andamento (quando se somam os que estão parados, seja por recursos no TRF-4 ou sobrestados por ordem do Supremo Tribunal Federal, por exemplo). O reforço mais recente foi a escolha de dois estagiários de Direito, entre 11 pré-selecionados, para auxiliar os trabalhos dos dois juízes. O resultado do processo seletivo foi divulgado no dia 5 de outubro.

Moro está ali desde 2003, quando a então 2ª Vara Federal Criminal foi implantada para tratar de crimes contra o sistema financeiro nacional e de lavagem de dinheiro. A criação foi parte de uma iniciativa do Judiciário brasileiro para criar varas especializadas no tema, liderada pelo ex-ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça. Foi naquele mesmo ano que o juiz aceitou a primeira delação premiada do doleiro Alberto Youssef no caso Banestado (sobre evasão de divisas na década de 1990). Dirigentes do banco paranaense foram condenados por ele em 2004.

Quem julga casos além da “lava jato” é a juíza substituta Gabriela Hardt. Ela chegou a ser realocada para uma das varas de execução fiscal, em outubro do ano passado, mas acabou tendo a permanência prorrogada e sendo oficializada no mesmo local que Sergio Moro.

No mês passado, ela absolveu um grupo acusado de usar empresas de informática para lavar dinheiro e evadir divisas. A sentença aplica a teoria dos frutos da árvore envenenada ao reconhecer como ilícitas interceptações telefônicas que ultrapassaram 15 dias. “Quanto às escutas subsequentes, é fato que cada prova colhida em um período de monitoramento era utilizada para se concluir pela necessidade das prorrogações que se seguiram, sendo por consequência todas as decisões (...) contaminadas por tal nulidade.”

Em maio deste ano, a juíza condenou doleiros acusados de usar as contas do Banestado de Nova York para enviar dinheiro ao exterior, de forma irregular. Eles foram absolvidos de parte dos crimes, porém, depois que Gabriela anulou algumas provas obtidas nos Estados Unidos sem cumprir regras de acordo bilateral entre os dois países. Os investigadores conseguiram documentos e extratos de uma conta sem formalizar o chamado MLAT, no qual o Ministério da Justiça precisa solicitar as informações ao procurador-geral dos Estados Unidos.

Atendimento

Moro costuma receber advogados em seu gabinete e ouve os argumentos de forma “cordial”, conforme relataram defensores que atuam na “lava jato” à revista Consultor Jurídico. A crítica maior se refere às audiências com os réus: advogados já reclamaram que o juiz atuaria como membro do Ministério Público, fazendo perguntas da acusação e até completando respostas de testemunhas. O juiz respondeu em uma das ocasiões que seu papel “é esclarecer contradições”.

Defensores também dizem ver parcialidade de Moro nos prazos processuais. Em 17 de novembro de 2014, por exemplo, advogados de vários réus solicitaram acesso a todos os termos de delações premiadas. Ficaram sem resposta ao menos até 23 de janeiro. No dia 18 de novembro, a Polícia Federal pediu a prorrogação da prisão temporária de alguns suspeitos. Fez o protocolo às 16h05 e recebeu a primeira resposta em 14 minutos. Às 20h38 do mesmo dia, Moro decretou as prisões. O juiz nega privilégios a uma das partes e atribui as críticas a “mero excesso retórico das defesas”, como escreveu em janeiro.

Segundo o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, levantamento feito por um grupo de advogados constatou que o tempo de Moro para proferir decisões na “lava jato” é semelhante ao que costumava dedicar anteriormente. As primeiras sentenças do caso demoraram cerca de seis meses a partir da denúncia.

Em fatias

Um revés na 13ª Vara Federal de Curitiba foi o “fatiamento” das investigações: em setembro, o STF decidiu que suspeitas envolvendo o Ministério do Planejamento deveriam ir para a Justiça Federal em São Paulo. Para o ministro Dias Toffoli, o fato de um delator ouvido em determinado processo apontar a existência de outros crimes não é suficiente para firmar a prevenção do juiz, porque o primeiro critério para fixar a competência é o local onde ocorreu o delito com pena mais grave ou onde se praticou o maior número de infrações.

Já o Ministério Público Federal entende que tudo faz parte do mesmo modus operandi: empresas que desviam dinheiro de contratos públicos, com auxílio de agentes, para abastecer contas de partidos políticos.

Ainda assim, os autos já chegaram à 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, outrora liderada pelo juiz federal Fausto De Sanctis. João Batista Gonçalves, o juiz titular atual, sinalizou ao jornal Valor Econômico ter entendimento diferente sobre questões penais, como o uso de colaborações: “Que diferença tem a tortura de alguém que ia para o pau de arara para fazer confissões e a tortura de alguém que é preso e só é solto com uma tornozeleira, depois que aceita a delação premiada?”

Por Marcos de Vasconcellos e Felipe Luchete
Fonte: Conjur

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