Verbas indenizatórias garantem salário de mais de R$ 700 mil em maio a juiz do TJMG

bit.ly/2WdUC2l | Com dívida pública que ultrapassa os R$ 115,6 bilhões, Minas Gerais repassou, em 2018, quase R$ 4,8 bilhões ao Tribunal de Justiça e R$ 1,9 bilhão ao Ministério Público para pagamento dos servidores. Mesmo com grave crise fiscal do estado, as verbas indenizatórias e os “penduricalhos” têm garantido que magistrados, promotores e procuradores recebam "supersalários". Em maio, um único juiz recebeu R$ 752.159,39. O vencimento líquido do mês de abril foi pago ao juiz de entrância especial Paulo Antonio de Carvalho e consta no Portal da Transparência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

De acordo com a Constituição Federal, membros do Judiciário e do Ministério Público devem receber, no máximo, 90,2% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Entretanto, a lei permite que o valor seja extrapolado no caso de inclusão de verbas indenizatórias.

Segundo o professor especialista em direito administrativo Carlos Henrique Barbosa, o teto só é utilizado como base para definição do valor bruto do subsídio. As verbas indenizatórias não são consideradas para fins de cálculo de remuneração. “Legalmente, estes valores são a recomposição de algum gasto que o juiz ou desembargador teve em prol do Poder Judiciário. É o caso de diárias, por exemplo”, explicou.

Ainda de acordo com o especialista, cada órgão do Poder Judiciário estabelece o que vai compor as verbas indenizatórias através do seu regimento interno. Ele explicou que não existe um limite com estes gastos previsto na Constituição.

O secretário-geral da ONG Contas Abertas, entidade que analisa gastos públicos no Brasil, Gil Castelo Branco, ponderou que, embora sejam legais, os supersalários deveriam ser analisados em um contexto maior.

“O Judiciário não pode ser uma ilha de prosperidade dentro de um país quebrado”, disse.
Minas Gerais é o segundo estado com maior número de magistrados do país. Perde apenas para São Paulo, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em relação aos gastos com folha de pagamento no ano passado, entre os cinco estados com maior número de habitantes, São Paulo ocupa a primeira posição, com despesa de R$ 9,6 bilhões, de acordo com o Portal da Transparência do estado.

Em segundo lugar, está Minas, com custo de quase R$ 4,8 bilhões. Em seguida, aparecem o Rio de Janeiro, que gastou R$ 2,8 bilhões; Bahia, que teve despesa de R$ 2,4 bilhões; e Paraná, com gasto de R$ 1,8 bilhão em 2018.

De acordo com a estrutura remuneratória dos membros da magistratura em Minas Gerais, os salários variam de R$ 30.404,42 para juízes substitutos e juízes de primeira entrância a R$ 35.462,00 para desembargadores.

Veja os maiores subsídios de juízes e desembargadores do TJMG

Fonte: Portal da Transparência TJMG

No Portal da Transparência do Tribunal de Justiça, o juiz que recebeu líquido R$ 752.159,39 no mês passado tem salário bruto de R$ 33.689,11. Entretanto, de verbas indenizatórias classificadas pelo TJMG como “vantagens eventuais”, ele recebeu, de uma só vez, R$ 725.037,51.

O mesmo aconteceu com outra juíza de entrância especial, Adriani Freire Diniz Garcia, de Alfenas, que teve o segundo maior vencimento líquido do mês de abril, pago em maio. Ao salário bruto, de R$33.689,11, somaram-se R$ 340.339,80 de “vantagens eventuais”. O valor líquido recebido no final do mês foi de R$ 366.766,30.

Em nota, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais afirmou que nenhum magistrado recebe subsídio mensal acima do teto constitucional. Segundo o órgão, “os subsídios dos magistrados mineiros são pagos de acordo com a legislação vigente e guardam proporcionalidade com os pagos aos ministros do STF.”

O TJ também explicou que alguns juízes e desembargadores podem receber, eventualmente, valores adicionais referentes a férias, férias-prêmio não gozadas e acumuladas ou reposições salariais.

“É comum que magistrados deixem de gozar as férias-prêmio durante toda sua carreira, optando por receber em espécie o valor correspondente, por ocasião de sua aposentadoria”, informou a nota.

Ainda segundo o Tribunal, o auxílio-moradia foi extinto em dezembro de 2018 e o TJMG foi o primeiro do país a interromper seu pagamento.

O G1 não conseguiu contato direto com os juízes citados. Por meio da assessoria de imprensa, o TJ informou que os dois magistrados se aposentaram em março e receberam os salários de abril com acréscimos referentes a direitos advindos da aposentadoria.

Ministério Público


No Portal da Transparência do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), a estrutura remuneratória aponta que os salários deveriam variar de R$ 30.404 no caso de promotor substituto e promotor de primeira entrância a R$ 35.462,00 no caso de procurador-geral.

Mas, pelo levantamento feito pelo G1, o maior salário bruto entre os servidores da ativa, no mês de abril, referente ao mês de março, o último disponível para consulta no Portal da Transparência, é de R$ 39.363,06. Muitos ainda recebem indenizações e outras remunerações.

O maior vencimento líquido de março, incluindo estes “penduricalhos”, foi recebido pela promotora Hebe Regina de Guerra e Leite: R$ 82.869,32. Pelo menos 268 promotores e procuradores receberam acima de R$ 36 mil, somando o valor líquido, indenizações e outras remunerações.

Já no caso de aposentados, o procurador Epaminondas Fulgêncio Neto recebeu, no mesmo mês, R$ 91.501,56. Quase 300 servidores nesta condição tiveram ganhos a partir de R$ 38 mil, somando à renda líquida, as indenizações e outras remunerações.

Em nota, o Ministério Público afirmou que o regime de remuneração “observa com fidelidade os parâmetros fixados na Constituição Federal. Eventuais valores que ultrapassam o teto remuneratório constitucional referem-se à quitação de rubricas devidas em atraso e indenizações de férias não gozadas em razão da necessidade do serviço”. Ainda segundo o MPMG, os pagamentos tiveram legalidade e legitimidade reconhecidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público e pelo Supremo Tribunal Federal.

De acordo com o Ministério Público, há um déficit no quadro de pessoal, o que interfere nas férias dos servidores. Segundo o órgão, são 260 cargos vagos no quadro de promotores e procuradores e 300 no de servidores, que não podem ser ocupados, por falta de verbas e para que não seja extrapolado o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal.

O quadro atual é de 2.764 servidores efetivos e 110 servidores de recrutamento amplo. São 915 promotores e 130 procuradores. Além disso, há 207 promotores e 106 procuradores inativos. São 289 servidores aposentados e 242 pensionistas.

A promotora citada, Hebe Regina Guerra e Leite, informou que recebeu o valor porque foi autorizada, pelo procurador-geral do MPMG, a restituição de gastos que ela teve com pagamento de plano de saúde. Ela afirmou que a medida tem como base a Lei Complementar 147, promulgada em dezembro do ano passado, que garante auxílio-saúde a promotores e procuradores de Minas Gerais.

Já o procurador Epaminondas Fulgêncio afirmou que se aposentou em fevereiro e que os valores recebidos em abril são de alguns pagamentos que teriam ficado para trás.

Reajuste automático


Em 2015, os deputados estaduais aprovaram, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), os reajustes automáticos de remuneração dos magistrados e dos membros do Ministério Público. O aumento também passou a ser concedido para inativos e pensionistas.

A lei estabelece que o reajuste dos juízes, desembargadores, promotores e procuradores é automático, sempre que houver alteração no subsídio em nível federal.

O último reajuste para os ministros do Supremo foi aprovado pelo Senado no dia 7 de novembro do ano passado, quando os salários passaram de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil.

O que diz o especialista


O secretário-geral da ONG Contas Abertas, entidade que analisa gastos públicos no Brasil, Gil Castelo Branco enfatizou que os supersalários não só no Judiciário, mas no setor público em geral, são um entrave para o crescimento no Brasil e que falta vontade entre os agentes para mudar a situação.

“O Banco Mundial já constatou que quase 70% dos servidores públicos estão entre os 10% mais ricos do Brasil. No geral, ganham 70% a mais do que os pares na iniciativa privada. E estes vencimentos não estão vinculados a melhoria do desempenho. (...) O diagnóstico está pronto e acabado. A discussão agora é se há ambiente político para que esta situação mude. Aparentemente, não há”, afirmou.

Gil Castelo Branco lembrou que, apesar da situação econômica do Brasil, com cortes na educação, o ano começou com aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal. “O déficit no país, de R$ 139 bilhões, chega a 7% do PIB. (...) Diante desta situação caótica, deveria existir um comprometimento de todos os três poderes para estabilizar a situação fiscal, dar as condições mínimas à economia. A partir do momento em que o próprio Poder Judiciário pressiona para ter reajuste de seus vencimentos, esta solidariedade não existe”, disse.

Fonte: g1 globo

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