Juiz que absolveu PMs de acusação de estupro em viatura será investigado por amizade com advogado de réu

Via @portalg1 | O juiz Ronaldo João Roth, do Tribunal de Justiça Militar, será investigado pela Procuradoria-Geral, do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), por suposto favorecimento ao advogado José Miguel da Silva Junior, no caso em que dois policiais militares foram absolvidos da acusação de estupro dentro de uma viatura por uma jovem, de 21 anos, em Praia Grande, no litoral de São Paulo, em 2019 (relembre o caso aqui).

O G1 divulgou, com exclusividade, que uma denúncia chegou ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) em junho, mesmo mês da absolvição dos réus, apontando uma relação íntima de amizade entre o magistrado que julgou o caso e o advogado de um dos réus — o que, segundo advogados da seção de Ética da OAB e especialistas em direito militar, pode acarretar em suspeição do juiz no processo.

A denúncia da relação dos dois, segundo o MP-SP, foi encaminhada à Promotoria de Justiça Militar, à Corregedoria do Tribunal de Justiça Militar e à Procuradoria-Geral de Justiça, que solicitou ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para investigar o caso. O despacho foi assinado pelo desembargador Cláudio Godoy na quinta-feira (9).

No pedido de instauração do procedimento investigatório, o Procurador de Justiça Mario Antonio de Campos Tebet aponta que o advogado não aparenta ter proximidade com nenhum outro magistrado sem ser Roth.

"Nas redes sociais de Jose Miguel, não se identificou nenhuma publicação indicativa de proximidade pessoal nos últimos dois anos com nenhum outro Magistrado, de nenhuma seara (Justiça Comum ou Justiça Militar), que não seja o Dr. Ronaldo Roth", escreveu o procurador.

Ainda, ele apontou que o magistrado interage com as publicações do advogado, "inclusive com aplausos em publicação de notícia de absolvição em caso de atuação do referido advogado".

O Código de Processo Civil diz que o juiz tem que se declarar impedido se for amigo do advogado das partes. Já o Código de Processo Militar, apenas se for amigo de uma das partes.

O Código de Processo Civil: Art. 145 diz que "há suspeição do juiz: I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados". E Código de Processo Penal Militar: Art. 38 diz que "o juiz dar-se-á por suspeito e, se o não fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: a) se for amigo íntimo ou inimigo de qualquer delas".

Em nota, o juiz afirma que “nada fez de errado, muito menos cometeu crime. E que o fato será apurado regularmente pelas instâncias constitucionais”. A reportagem também tentou contato com o advogado José Miguel, mas não teve resposta.

Sentença pode ser anulada

Foi Roth quem decidiu pela absolvição dos policiais militares com relação ao crime sexual, e entendeu que houve sexo consensual. Segundo ele, a vítima "nada fez para se ver livre da situação", e "não resistiu ao sexo".

Sêmen foi encontrado na viatura que estava em movimento e com giroflex ligado. O celular da jovem também foi achado no carro. Ela disse que foi obrigada a fazer sexo vaginal e oral.

Caso o inquérito conclua que o juiz Roth favoreceu o advogado, poderá ser determinada a suspeição do magistrado e a sentença que absolveu a dupla de policiais militares da acusação de estupro pode ser anulada e submetida a um novo julgamento, com outro juiz. É o que explica Maurício Zanoide de Moraes, professor de processo penal da Universidade de São Paulo (USP) e advogado criminalista.

Trabalho juntos e fotos em redes sociais

A denúncia foi protocolada na Ouvidoria do MP no dia 25 de junho, e encaminhada no dia 29 do mesmo mês para a Promotoria de Justiça Militar. Segundo apurado pelo G1, o magistrado e o advogado trabalham juntos na Escola de Direito Militar (EPD) de São Paulo. O juiz Roth é coordenador do curso de pós-graduação em Direito Militar, enquanto o advogado José Miguel é um dos professores do mesmo curso.

Além disso, o G1 encontrou registros de fotos dos dois juntos nas redes sociais de ambos. As imagens, publicadas ao longo de anos, mostram encontros em cafeterias, escritórios e até durante um desfile de escola de samba, no carnaval de 2017, na quadra da agremiação Vila Maria.

Em muitas das publicações, José Miguel se refere ao juiz como "amigo".

As postagens datam de, pelo menos, 2017 até este ano. Em uma delas, a legenda escrita pelo advogado diz: "Hoje não falamos de direito. Colocando o papo em dia com o mestre Ronaldo Roth".

O que dizem os PMs

José Miguel representa o PM que dirigia a viatura no momento em que, segundo relato da jovem, o outro agente a estuprava. Além dele, os advogados Filipe Molina e Luiz Nakaharada completam a defesa. Ele alegou que foi surpreendido com a prática do ato, e que não sabia da intenção do colega.

O outro soldado, que, segundo a sentença, sentou-se ao lado da vítima no banco traseiro do carro, foi condenado pelo crime previsto no artigo 235 do Código Penal Militar, que prevê até um ano de detenção por libidinagem ou pederastia em ambiente militar. Mas ele não será preso, já que a pena é de sete meses de detenção, em regime aberto, e o juiz suspendeu o cumprimento da pena.

Na decisão, à qual o G1 teve acesso, o juiz afirma que a vítima "nada fez para se ver livre da situação", e que "não reagiu". No entendimento do magistrado, assim, "não houve violência", segundo a sentença. "Não houve nenhuma violência ou ameaça", escreveu. Ele absolveu os PMs da acusação de estupro, pois entendeu que, neste caso, o sexo foi consensual.

Para Roth, "a vítima poderia, sim, resistir à prática do fato libidinoso, mas não o fez".

A decisão é de 8 de junho, está em segredo de Justiça e somente foi lida aos réus na semana passada. Ainda cabe recurso. O Ministério Público de São Paulo informou que a decisão foi para ciência do órgão no último dia 23, e está sendo analisada inclusive em relação à pena imposta.

A Secretaria de Segurança Pública (SSP), também por meio de nota, informou que os policiais citados respondem a processo disciplinar demissionário pela instituição, e seguem afastados do trabalho operacional. "Cumpre esclarecer que o processo administrativo é independente do processo penal-militar. Em que pese a decisão do Tribunal de Justiça Militar [TJM], ainda há graves infrações sendo apuradas em Processo Regular", afirmou a SSP.

Fonte: G1

1/Comentários

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  1. Juízes, revejam a decisão e punam os PMs responsáveis pelo estupro da menina de 19 anos! Abaixo a cultura do estupro! Justiça para as mulheres!

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