Vereador de São Paulo é flagrado com fala racista em sessão: “É coisa de preto!”

Via @portalg1 | A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as empresas de aplicativo na Câmara Municipal de São Paulo teve os trabalhos interrompidos temporariamente nesta terça-feira (3) após o microfone do vereador Camilo Cristófaro (PSB) ter vazado no plenário dizendo a frase “é coisa de preto” na frente dos outros parlamentares. 

O flagrante aconteceu no início da sessão que ouviu a ex-CEO da empresa Uber, Claudia Woods, e o sócio da empresa de motofrete THL, Thiago Henrique Lima.

“Não lavar a calçada...é coisa de preto, né?”, disse o áudio vazado no plenário (ouça aqui).

Camilo Cristófaro não estava presente na Câmara durante a fala, mas participava da sessão de forma remota, através de videoconferência.

A imagem dele não apareceu no painel do plenário durante o vazamento do áudio, mas a Mesa que dirigia os trabalhos confirmou que ele já estava plugado e participando da sessão.

O vereador admitiu que a voz é dele e deu duas versões diferentes para a frase (veja abaixo). Primeiro, disse que falava sobre carros. Depois, que se dirigia a um amigo.

O vereador Camilo Cristófaro (PSB) durante discurso na Câmara Municipal de São Paulo. — Foto: André Bueno/CMSP

Após o ocorrido, o presidente da CPI, Adilson Amadeu (União Brasil), suspendeu os trabalhos por cinco minutos para deliberar internamente sobre o impacto da frase.

Na retomada dos trabalhos, a vereadora Luana Alves (PSOL), que é negra, declarou que Cristófaro foi “extremamente racista”.

“Infelizmente nós temos a sessão completamente tumultuada por um áudio que tem a voz do vereador Camilo Cristófaro, que acaba de proferir uma frase extremamente racista. Eu queria não acreditar que essa fala existiu, mas infelizmente existiu. Conversamos ali atrás, queria pedir à secretaria da Mesa das notas taquigráficas. Ficará registrado. Ficou acordado que todos aqui são testemunhas para todas as ações que venham a ocorrer se ficar comprovado que é do vereador Camilo Cristófaro, como parece ser”, disse Luana Alves.

Em nota, o PSB informou que Cristófaro está em processo de desfiliação do partido desde 28 de abril. "Ele pediu a desfiliação alegando que tem pensamentos diferentes em relação aos defendidos por nós, do PSB. Cabe ressaltar que repudiamos veementemente qualquer declaração preconceituosa.

"Números do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram um aumento significativo dos processos de racismo abertos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo entre 2018 e 2020. Em 2018, a Justiça paulista abriu 20 processos por racismo no estado. No ano seguinte, o número saltou para 254 e, em 2020, chegou a 269.

A vereadora Luana Alves (PSOL) durante a sessão da CPI dos Aplicativos na Câmara Municipal de SP nesta terça-feira (3). — Foto: Reprodução/Youtube

Investigação e repercussão

O gabinete da vereadora Luana Alves afirma que entrará com representação na Corregedoria para que Cistófao seja investigado pela Casa por ato de racismo.

A vereadora Elaine Minero, do Mandato Coletivo Quilombo Periférico do PSOL, também afirmou que “tomará as ações necessárias para a atitude racista do vereador não fique impune”.

O presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil), lamentou com “indignação imensa” a fala do vereador e disse que o caso será apurado pela Corregedoria.

“É com uma indignação imensa que lamento mais uma denúncia de episódio racista dentro da Câmara de Vereadores de São Paulo, local democrático, livre e que acolhe a todos. Como negro e presidente da Câmara tenho lutado com todas as forças contra o racismo, crime que insiste em ser cometido dentro de uma Casa de Leis e fora dela também. O caso será apurado pela Corregedoria da Câmara Municipal de São Paulo”, disse em nota.

O que disse o vereador

O g1 procurou o gabinete do vereador do PSB e não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem.

Cristófaro apresentou duas versões diferentes para a frase. Ao justificar a fala para os colegas vereadores, o parlamentar afirmou, na primeira versão, gravada em vídeo por volta de 11h20 e enviada aos colegas da Câmara por What'sApp, que se referia a “carros pretos que são f... e não é fácil para cuidar da pintura”.

No vídeo, ele reconhece o áudio, mostra o chão molhado da loja e diz que se referia ao lugar.

“São 11h20 da manhã e estou fazendo uma gravação aqui. Estou dizendo exatamente que esses carros pretos dão trabalho. Que os carros pretos são f... Estou dizendo aqui que não é fácil para cuidar da pintura. Então, se a vereadora Luana olhou pro outro lado, 70% das pessoas que me acompanham, vereadora, são negros. Então, a senhora não vêm com conversa. Olha só, estão lavando aqui, oh. Estou dizendo que carro preto dá trabalho, que carro preto é f... dão mais trabalho para polir. Se a senhora quer levar para outro lado, pra fazer campanha política, nas minhas costas não vai fazer” (veja aqui).

Mais tarde, às 14h, ao participar do Colégio de Líderes da Câmara com outros parlamentares, ele deu uma nova versão do caso, dizendo que estava conversando com um colega negro, de nome Anderson Chuchu, que é considerado um irmão para ele e quem o vereador tem muita intimidade.

“Eu ia gravar um programa que não foi gravado lá no meu galpão de carros. Eu estava com o Chuchu, que é o chefe de gabinete da Sub do Ipiranga, e [ele] é negro. Eu comentei com ele, que estava lá. Inclusive no domingo nós fizemos uma limpeza e quando eu cheguei eu falei: ‘isso aí é coisa de preto, né?’. Falei pro [Anderson] Chuchu, como irmão, porque ele é meu irmão”, afirmou o vereador.

“Se eu errei é porque eu tenho essa intimidade com ele, porque ele me chama de carequinha, ele me chama de ‘veínho’. Nós temos essa intimidade. Ele é um irmão meu”, completou (veja aqui).

Histórico de brigas de Cristófaro

Os vereadores Camilo Cristófaro (PSB) e Adilson Amadeu (União Brasil). — Foto: Montagem/g1

O vereador Camilo Cristófaro (PSB) é figura frequente nas confusões da Câmara Municipal. Em março, ele ingressou com uma representação na Corregedoria da Câmara Municipal de São Paulo contra o colega Adilson Amadeu (União Brasil) após os dois se xingarem no grupo de WhatsApp dos vereadores.

Na representação, Cristófaro acusa o colega de conduta ofensiva. A briga entre os dois parlamentares ocorreu na noite de 5 de março, após uma discussão sobre a atuação de parlamentares na chamada Feirinha da Madrugada, área de comércio popular no Brás, no Centro de São Paulo.

No grupo, Cristófaro insinuou que Adilson Amadeu é “sócio da Feirinha da Madrugada”, segundo prints que o g1 teve acesso através de outros vereadores que fazem parte do grupo.

Amadeu rebateu e acusou o colega de “cuspir no prato que comeu” e “FDP”.

"Já estou te processando por você ter ofendido a minha família”, declarou Adilson Amadeu, que ameaçou" quebrar a cara" do colega.

Briga de vereadores Camilo Cristófaro e Adilson Amadeu no grupo de vereadores da Câmara Municipal de São Paulo em 5 de março. — Foto: Reprodução

"Você é doente. Precisa se tratar. Minha mãe está morta. Tenho caráter. Tenho palavra. Tenho vergonha na cara. Tenho família. Minha mãe está morta", respondeu o vereador do PSB.

Por meio de nota, o vereador Adilson Amadeu afirmou que a ação ainda está em fase de admissibilidade na Corregedoria, mas ele está “tranquilo e fará a defesa baseada nos autos da representação, caso ela realmente prospere”.

“Me entristece saber que, diante de assuntos extremamente mais relevantes, o colega parlamentar despenda tempo valioso da Corregedoria, com uma série de outras questões mais importantes pela frente, além do uso de dinheiro público para tentar novamente ganhar holofotes em cima de meu nome”, disse Amadeu.

Briga dos vereadores Camilo Cristófaro (PSB) e Adilson Amadeu (União Brasil) no grupo da Câmara Municipal de SP. — Foto: Reprodução

“Durante a campanha de 2020, o parlamentar já havia agredido a honra de minha família, para tentar polarizar em cima da minha candidatura. Não sou o primeiro e tampouco serei o último pelo visto. Não é de hoje que esse tipo de atitude lastimável se faz presente. Já tivemos ao menos três outros colegas que foram agredidos verbalmente pelo mesmo parlamentar, casos da hoje deputada Isa Penna e dos vereadores George Hato e Aurélio Nomura?, completou o vereador.

Na época do caso, o g1 também procurou a assessoria de imprensa de Camilo Cristófaro, mas não obteve retorno.

Vereadores durante sessão plenária na Câmara Municipal de São Paulo. — Foto: Afonso Braga/Rede Câmara

Vereador briguento

Em 14 de março, uma mulher registrou boletim de ocorrência contra Camilo Cristófaro após ser agredida verbalmente por ele ao reclamar de enchentes na Zona Sul de São Paulo.

A confusão ocorreu durante visita de Ricardo Nunes (MDB) ao Sacomã. Ao falar com o prefeito sobre a situação do bairro, a assistente social disse que foi xingada e arrastada pelo braço por Cristófaro.

Ela registrou de ocorrência por injúria no 26º DP do Sacomã (veja o vídeo aqui). O vereador afirmou que o caso é fruto de disputa de políticos da região (leia mais aqui).

Em junho de 2017, Cristófaro já havia protagonizado um bate-boca que terminou em agressão física a um assessor parlamentar do vereador Eduardo Suplicy (PT), que teve o celular arrancado da mão após a discussão.

Fonte: g1

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