Ao tratar de um caso de medida protetiva a menina de 12 anos que se sentiu assediada por professor, o magistrado criticou o "discurso feminista", dizendo que hoje quem está correndo atrás de homem são as mulheres.
Na nota (íntegra abaixo), publicada no site do Tribunal, ele disse que sempre defendeu a igualdade entre homens e mulheres.
O Tribunal, por sua vez, emitiu outra nota dizendo que "não endossa os comentários" feitos pelo magistrado, e que foi aberta investigação preliminar no âmbito da Corte.
Por fim, a Comissão de Igualdade e Gênero do TJ/PR emitiu uma terceira nota em repúdio ao "lamentável episódio"; e que, "certamente em defesa do assediador", imputou às mulheres a prática generalizada do "assédio aos homens".
"O episódio mencionado revela o quão ainda estão internalizados neste segmento específico da sociedade brasileira, opiniões preconceituosas, conceitos misóginos, hábitos discriminatórios, desrespeitosos e até predatórios contra pessoas do gênero feminino, crianças, adolescentes e adultas".
Vale lembrar que este mesmo desembargador já foi condenado, em 2023, pela lei Maria da Penha, por violência doméstica contra a irmã e a mãe.
Veja a íntegra das notas:
Nota pública do desembargador Luis Cesar de Paula Espindola
Esclareço que nunca houve a intenção de menosprezar o comportamento feminino nas declarações proferidas por mim durante a sessão da 12ª Câmara Cível do Tribunal, afinal, sempre defendi a igualdade entre homens e mulheres, tanto em minha vida pessoal quanto em minhas decisões. Lamento profundamente o ocorrido e me solidarizo com todas e todos que se sentiram ofendidos com a divulgação parcial do vídeo da sessão.
Desembargador Luis Cesar de Paula Espindola.
Nota pública de esclarecimento do TJPR
O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná vem a público esclarecer que não endossa os comentários feitos pelo Desembargador Luis Cesar de Paula Espindola durante sessão da 12ª Câmara Cível do Tribunal no dia 3 de julho de 2024.
Já foi aberta investigação preliminar no âmbito desta corte, com base na Resolução 135 do CNJ, e o desembargador terá prazo de 5 dias para se manifestar.
O Tribunal reitera que não compartilha de qualquer opinião que possa ser discriminatória ou depreciativa, como, aliás, é próprio de sua tradição e história de mais de 132 anos.
Nota técnica da comissão de igualdade e gênero do TJPR
A Comissão de Igualdade e Gênero, no exercício da competência e responsabilidade que lhe atribuiu o Artigo 2º , Incisos II e VI do Decreto Judiciário Nº 546/2021, vem manifestar-se sobre o lamentável episódio protagonizado pelo desembargador Luís César de Paula Espíndola na sessão Julgamento por Videoconferência da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) na última quarta-feira, 3 de julho de 2024, testemunhado pelos demais presentes e registrado nos canais utilizados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná para ampliar a transparência e publicidade do trabalho de prestação jurisdicional.
O Inciso II dispõe que compete a Comissão "promover a conscientização, no âmbito interno, para a necessidade de respeito à diversidade, visando à erradicação de preconceitos e práticas discriminatórias;" e o Inciso VI lhe impõe a responsabilidade de "identificar eventuais manifestações de preconceitos e práticas discriminatórias no âmbito interno do Poder Judiciário do Paraná e propor medidas visando eliminá-las;".
Em sua manifestação a o final da votação de um recurso que tratava de um caso de assédio praticado por um professor contra uma aluna de 12 anos de idade, o desembargador Luís César de Paula Espíndola afirmou que "as mulheres estão loucas atrás dos homens" e, certamente em defesa do assediador, imputou às mulheres a prática generalizada do "assédio aos homens", comportamento que diz enxergar no dia a dia da sociedade.
O episódio mencionado revela o quão ainda estão internalizados neste segmento específico da sociedade brasileira, opiniões preconceituosas, conceitos misóginos, hábitos discriminatórios, desrespeitosos e até predatórios contra pessoas do gênero feminino, crianças, adolescentes e adultas, reduzidas a condição de seres de segunda classe e, neste caso, de ameaças o livre exercício da masculinidade dos "cidadãos de bem".
Tal pensamento altamente discriminatório e desrespeitoso com as mulheres é totalmente incompatível com a dignidade e solenidade de uma Sessão de Julgamento, especialmente por expressar a injustificada ignorância sobre o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, de cumprimento obrigatório pelos Magistrados e Tribunais, além do desprezo e desrespeito pelas colegas Desembargadoras, servidoras e demais mulheres presentes naquele ambiente físico e virtual.
Atitudes desse tipo não podem ser toleradas no ambiente de trabalho presencial ou virtual desta Corte de Justiça, já que afeta negativamente a credibilidade, austeridade e solenidade que os jurisdicionados esperam ver encarnadas nas pessoas dos magistrados e magistradas e em suas atitudes, posturas e comportamentos.
A Comissão de igualdade e Gênero, que é integrada por magistradas, magistrados, servidoras e servidores, repudia o ocorrido e lamenta o conseqüente constrangimento que se estendeu a toda a magistratura paranaense e ao corpo funcional do TJPR, esperando que, enquanto coletividade, tenhamos a grandeza de reafirmar publicamente nosso compromisso sincero com a promoção das mudanças de mentalidade e comportamento que nos aproximarão cada vez mais da imagem positiva e respeitável que o Poder Judiciário tem e precisa preservar no imaginário da sociedade.
Curitiba, 04 de julho de 2024.
Desembargadora Maria Aparecida Blanco de Lima
Presidente da Comissão de Igualdade e Gênero do Tribunal de Justiça do Paraná