Barroso questionou onde foi que o brasileiro se perdeu nesse “mundo de ódio, intolerância e golpismo?”. Em seguida, fez uma linha do tempo de episódios que atentaram contra a democracia e desrespeitaram as instituições que compõem a República. “Esse episódio de ontem se soma ao que já vinha ocorrendo no país nos últimos anos”, disse na Corte.
Veja a linha do tempo da fala de Barroso:
• Em fevereiro de 2021, um deputado divulgou um vídeo com discurso de ódio, ofensas e ameaças aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, num grau inimaginável de grosseria e incivilidade;
• Em outubro de 2022, um parlamentar, notório por esquemas variados, desrespeita ordem do STF e ataca os policiais federais com fuzis e granadas. Disse que era em nome da liberdade (caso Roberto Jefferson);
• Em outubro de 2022, uma parlamentar persegue de arma em punho um cidadão que havia se manifestado criticamente, em tom, aliás, muito menos grave do que aquele a que todos nós vínhamos sendo submetidos (caso Carla Zambelli);
• Ao longo dos meses de novembro e dezembro de 2022, após bloqueio de estradas, milhares de pessoas acamparam nas portas de quartéis por todo o país pedindo desrespeito ao resultado das eleições e golpe de Estado. Muitos deles insuflados pela afirmação criminosamente mentirosa de que teria havido fraude nas eleições
• No dia 8 de janeiro de 2023, milhares de pessoas, mancomunadas via redes sociais, e com a grave cumplicidade de autoridades, invadiram e depredaram as sedes dos três Poderes da República;
• Relativamente a este último episódio, algumas pessoas foram da indignação à pena, procurando naturalizar o absurdo. Não veem que dão um incentivo para que o mesmo tipo de comportamento ocorra outras vezes. Querem perdoar sem antes sequer condenar.
Barroso ressaltou que “a gravidade do atentado desta quarta alerta para a preocupante realidade de que persiste no Brasil a ideia de aplacar e deslegitimar a democracia e suas instituições, numa perspectiva autoritária e não pluralista de exercício do poder, inspirada pela intolerância, pela violência e pela desinformação. Reforça também, e sobretudo, a necessidade de responsabilização de todos que atentem contra a democracia”.
“Onde foi que nós perdemos a luz da nossa alma afetuosa, alegre e fraterna para a escuridão do ódio, da agressividade e da violência? Estamos importando mercadorias espiritualmente defeituosas de outros países que se desencontraram na história.”
Barroso ainda descreveu ponto a ponto o atentado:
• Por volta de 19h30 de quarta-feira (13/11/2024), um homem que já foi identificado (Francisco Wanderley Luiz) se aproximou com uma mochila e um extintor de incêndio da Estátua da Justiça, em frente ao STF, e jogou um pano na estátua;
• Diante da movimentação, um segurança do STF se aproximou para a abordagem. As imagens das câmeras de vigilância mostraram o momento em que suspeito deixa a mochila no chão e recua, e mais agentes começam a se aproximar;
• O homem atirou então o primeiro artefato em direção à estátua, que não explodiu, e os agentes corajosamente começaram a cercá-lo. Ele arremessou um segundo artefato, que caiu mais perto da marquise do tribunal, e causou uma explosão. A equipe de segurança conseguiu evitar que o homem se aproximasse do Tribunal;
• Diante do cerco, esta pessoa acendeu mais um artefato, se deitou sobre ele e houve uma segunda explosão – causando-lhe morte imediata. Depois disso, a Polícia Judicial fez o primeiro isolamento do local;
• Na sequência, a Polícia Militar e a Polícia Federal assumiram os trabalhos, em parceria com nossa equipe de segurança, para averiguar outros artefatos que estavam na roupa do homem, na mochila e os que ele havia arremessado. Os trabalhos duraram toda a madrugada, e o corpo foi retirado às 9h desta quinta (14/11);
• Em uma coletiva de imprensa concedida no fim da manhã desta quinta, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, informou que o autor do atentado mantinha um grande número de explosivos na casa alugada por ele em Ceilândia, que foi alvo de operação policial;
• Uma gaveta, que felizmente foi aberta por um robô antibombas, gerou uma grande explosão. Ninguém se feriu, mas o episódio mostra o nível de periculosidade das pessoas com as quais estamos lidando.
Assim, o presidente do STF cumprimentou os agentes de segurança e da polícia judicial do Supremo Tribunal Federal pela atuação no caso, bem como a Polícia Federal e a Polícia do Distrito Federal, “pela presteza e empenho com que trataram do assunto”.
Intenção de matar ministros
Durante coletiva de imprensa, nesta quinta-feira (14/11), o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, responsável pelas explosões, tinha intenção de “matar ministros da Suprema Corte”, e que seu alvo principal era Alexandre de Moraes.
Segundo o diretor-geral da corporação, esse não foi um fato isolado e se conecta com outras investigações da PF, como o inquérito sobre os atos golpistas do 8 de Janeiro.
“[O caso] Mostra a vinculação desses grupos radicais que culminam nessa barbaridade que acontece ontem, na tentativa de matar ministros da Suprema Corte, e também que culminou nesse lamentável episódio do suicídio dessa pessoa”, disse Andrei Rodrigues, ao citar uma mensagem deixada para uma bolsonarista presa pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, no espelho da casa que o homem-bomba alugava em Brasília.
Andrei Rodrigues confirmou que o alvo principal do atentado era o ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes. “Parece que essa pessoa queria entrar no prédio do Supremo, não conseguiu e, por isso, resolveu fazer o que fez”, afirmou.
O diretor-geral citou um áudio, atribuído à ex-esposa de Francisco Wanderley, que corroboraria a hipótese de Moraes ser, de fato, o alvo do homem-bomba. “O próprio áudio [da esposa] e outras mensagens enviadas nas redes sociais ameaçando a Corte, especificamente nesse caso da senhora, diziam que o alvo dessa pessoa era, sim, o ministro Alexandre de Moraes”, destacou o chefe da Polícia Federal.
Extremistas ativos
Na coletiva, o diretor-geral da PF ressaltou que grupos extremistas estão ativos no país. “Esse episódio de ontem não é um fato isolado. A PF tem investigado num período recente”, declarou Andrei Rodrigues, no início da coletiva. “Houve tentativa de matar ministros da Suprema Corte”, disse.
De acordo com o diretor-geral da PF, os “explosivos eram artesanais, mas com grau grande de danos, parecido com granada,” e os atos teriam sido planejados com antecedência. “Há indícios de planejamento em longo prazo. Esteve em Brasília no início de 2023. Uma investigação apura se ele estava no 8/1.”
Ainda não foi possível confirmar se o homem participou dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. “Ainda é cedo para dizer se houve participação nos atos de 8 de janeiro.”
Por Manoela Alcântara
Fonte: metropoles.com