Moraes é o relator, na Primeira Turma da Corte, do processo penal contra o chamado núcleo crucial da trama golpista – parte de uma organização criminosa que tentou manter o ex-presidente no poder e impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Como relator, Moraes foi o primeiro a votar no julgamento. Os demais ministros – Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, presidente do colegiado – ainda precisam se posicionar.
Os tamanhos das penas ainda serão debatidos e definidos pelos magistrados. A expectativa é de que o julgamento seja concluído até a próxima sexta-feira (12).
O ministro votou pela condenação de todos os oito réus pelos seguintes crimes denunciados pela Procuradoria-Geral da República:
• Organização criminosa armada
• Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito
• Tentativa de golpe de Estado
Nos crimes de dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado, Moraes votou pela condenação de sete dos oito réus do núcleo crucial. A única exceção foi o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) – a ação contra o parlamentar por esses dois crimes foi suspensa por decisão da Câmara dos Deputados.
Além do ex-presidente, a Primeira Turma do STF também julga:
• Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
• Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
• Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
• general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
• Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência;
• Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
• Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro.
Para Moraes, Jair Bolsonaro, que está preso em regime domiciliar, liderou a organização criminosa que tinha um projeto autoritário de poder e tentou impedir ou depor o governo eleito.
As provas, segundo Moraes
Ao longo do julgamento, Moraes listou o que para ele são provas "cabais" da tentativa de golpe.
O ministro descreveu uma sequência de atos, citou documentos e mensagens que, em sua visão, demonstram a existência de uma organização criminosa hierarquizada sob a liderança do ex-presidente Jair Bolsonaro.
• Live de julho de 2021
Em primeiro lugar, Moraes apontou a live de julho de 2021, quando Bolsonaro fez ataques sem provas às urnas eletrônicas. Para o relator, não foi apenas discurso político: “Todas as mentiras criminosas feitas na live eram disseminadas pelas milícias digitais. A live foi mais um ato executório”, disse.
• Reunião ministerial em 2022
Outro ponto destacado foi a reunião ministerial de 5 de julho de 2022, encontrada no computador de Mauro Cid. O ministro classificou o encontro como uma “confissão” dos participantes.
“A reunião ministerial agravou a atuação contra o Estado Democrático de Direito. Tudo isso constou da minuta do golpe — prisões, fechamento do TSE, gabinete pós-golpe”, afirmou.
Reunião com embaixadores
A seguir, Moraes mencionou a reunião com embaixadores em 18 de julho de 2022, no Palácio da Alvorada, quando Bolsonaro repetiu ataques às urnas diante de diplomatas estrangeiros.
“Essa reunião talvez entre para a história como um dos momentos de maior entreguismo nacional, preparatória para uma tentativa de retorno à posição de colônia brasileira, só que não mais em Portugal”, disse.
• Ações da PRF
Também foram citadas as operações da PRF no segundo turno de 2022, em especial no Nordeste. Para Moraes, as abordagens não foram casuais.
“A cronologia comprova a ilicitude dessa conduta, liderada por Bolsonaro, com participação de Anderson Torres. Aqui a cronologia mostra o absurdo total e o desespero desse grupo criminoso”, declarou.
• Plano Punhal Verde e Amarelo
Entre novembro e dezembro de 2022, segundo o ministro, avançaram planos concretos de ruptura. Moraes destacou o documento chamado “Punhal Verde e Amarelo”, que previa a neutralização de autoridades.
“Se pretendia matar o presidente eleito da República. Não é possível banalizar esse retorno a momentos obscuros da nossa história. A prova é farta: o documento Punhal Verde e Amarelo foi impresso no Palácio do Planalto em 9 de novembro”, disse.
Nesse contexto, Moraes chamou atenção para o encontro do general Mário Fernandes com Bolsonaro logo após imprimir o plano.
“Não é crível achar que ele imprimiu, foi ao Alvorada, ficou uma hora e seis minutos com o presidente e fez barquinho de papel com o plano. Isso seria ridicularizar a inteligência do tribunal”, ironizou.
Outro elemento considerado crucial foi o áudio gravado por Mário Fernandes e enviado a Mauro Cid, no qual Bolsonaro teria anuído com a possibilidade de agir até a diplomação.
“Não há prova mais cabal além desse áudio. Todas as alegações do colaborador Mauro Cid foram confirmadas por reuniões, impressões dos planos e por esse registro patente da participação do líder da organização criminosa”, disse Moraes.
• Minutas golpistas
O ministro também afirmou que não há dúvidas sobre a ligação de Bolsonaro com as minutas de decreto que previam prisão de ministros e intervenção no TSE.
“A organização já tinha decidido pelo golpe — só faltava definir os termos do golpe”, resumiu.
• Atos violentos
Por fim, Moraes lembrou episódios violentos, como a bomba em caminhão no Natal de 2022, os ataques em 12 de dezembro e a invasão de 8 de Janeiro.
“Nós estamos esquecendo aos poucos que o Brasil quase voltou a uma ditadura que durou 20 anos, porque uma organização criminosa constituída por um grupo político não sabe perder eleições”, disse o ministro.
Por Luiz Felipe Barbiéri, Reynaldo Turollo Jr, Márcio Falcão, Afonso Ferreira, Gustavo Garcia, g1 — Brasília
Fonte: g1