Os privilégios dos juízes

A Comunicação Social (CS) informou que os juízes “fogem às novas regras do Estado”!

Os juízes, por nada e por tudo, gostam de apregoar a sua independência. Nós não gostamos de os ouvir.

Gostamos de repetir que há uma justiça para ricos e outra para pobres. Com razão. Os juízes, em grande parte, acham que a sua independência é fazer o que lhes apetece. Sem prestar contas a ninguém. É um privilégio. Não é.

A independência dos juízes é apenas, e já é muito, decidir o processo segundo a Constituição e a Lei, sem influências de ninguém, inclusive do poder político. É uma garantia dos cidadãos. Não um privilégio dos juízes.

Num Estado de Direito não pode ser de outro modo. De contrário, lá se vai a liberdade e segurança dos cidadãos. Por isso também que os juízes não podem ser suspensos, transferidos ou afastados das suas funções. A não ser nas hipóteses legais.

A CS percebe muito bem isto. Mas, como os juízes, faz de conta que não percebe. Ou quer juízes às ordens do Governo ou outras forças sociais e políticas. Juízes do Tribunal Constitucional (TC) que decidam das inconstitucionalidades do Orçamento do Estado (OE) como as pressões do Governo? Juízes que decidam quem pode ou não pode candidatar-se a certa autarquia, de acordo com o ministro da administração interna, ou de outro ministro qualquer? Juízes que o ministro da justiça transfira por lhe não ter agradado certa decisão? Ou até demita. Se quer isso, então não teremos juízes mas funcionários subalternos a decidir como quer o Governo. Não se pode querer isto e o seu contrário.

Essas exigências estatutárias dos juízes, comuns a qualquer país democrático, e constantes das declarações da ONU, da UE e da Constituição, implicam uma regulamentação específica, especial se se quiser, que não pode nunca ser posta de lado.

Este “especial” não é oferecido aos juízes. Como muitos pensam. É garantia dos cidadãos. Os juízes não são funcionários. Antes elementos de um órgão de soberania, os tribunais. Estes, se se querem independentes, têm, forçosamente, de ter juízes independentes. Se o não são, é outra história.

Ninguém quer ver um dirigente desportivo ou um ministro a ser julgado por juízes (?) à escolha do poder. Ou sob ameaça.

Estas considerações genéricas valem para o Ministério Público (MP). Com os arranjos a convocar. A menos que se queira não uma magistratura, mas um corpo de funcionários que acusa ou arquiva, conforme as ordens e interesses do poder político. Se o processo penal sai da órbita de uma magistratura, ficamos todos, também aí, sujeitos aos desejos e abusos do poder político. E não só. Convém lembrar ao MP que a sua sempre apregoada autonomia lhe é concedida para defesa das liberdades e garantias do cidadão, dos interesses comunitários e não privilégio dele. Como muitas vezes esquece e supõe.

Mal. Não merece essa autonomia. Mas devia merecê-la. Por fundamental.

Tudo ideias gerais. Que se tinham por adquiridas. Afinal, não estão.

Pela natureza das funções das magistraturas é que não faz sentido nenhum, mas nenhum mesmo, a insídia de que os “juízes fogem às novas regras do Estado”.

Magistrados não são funcionários.

Embora, não poucas vezes, procedam como tal.

Por Alberto Pinto Nogueira
Fonte: publico.pt
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