goo.gl/eA31Mx | Convidados a participar da audiência pública que discutirá o projeto de reforma do Código Penal no Senado, cinco professores da matéria decidiram enviar um projeto alternativo de reforma da Parte Geral do texto. O documento parte do texto em vigor, com a redação dada pela reforma de 1984, com a intenção de confrontar o trabalho deles com o projeto em discussão no Congresso, já aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A audiência acontece nesta terça-feira (8/8), às 10h.
A ideia surgiu porque o projeto de reforma tem “defeitos insuportáveis” em sua Parte Geral, conforme explicam os autores na introdução ao trabalho, assinado pelos professores Luís Greco, Frederico Horta, Alaor Leite, Adriano Teixeira e Gustavo Quandt.
Esses defeitos foram expostos no livro Reforma Penal: a crítica científica à Parte Geral do Projeto de Código Penal, coordenado por Alor Leite e com textos de todos os autores do projeto alternativo.
Em entrevista à ConJur, Leite explica que a Parte Geral do Código Penal é a espinha dorsal da lei, a “fundação do prédio”. Portanto, erros nesse trecho comprometeriam todo o sistema penal brasileiro. Caso aprovado, o projeto põe em risco de inconstitucionalidade toda a estrutura penal do país, que é exatamente o que o projeto pretendia consertar e adequar à Constituição Federal quando foi anunciado, em 2012, lembra o professor, assistente científico na Universidade de Augsburg, na Alemanha.
O projeto em discussão no Senado, diz a introdução ao texto alternativo, “padece de irrecuperáveis defeitos sistemáticos, agravados pelo excesso de alterações aleatórias a que se procedeu ao longo dos últimos conturbados cinco anos”.
Entre os problemas, os professores apontam a previsão de crimes e penas já na Parte Geral. “Esse setor do Código não se presta a prever crimes e cominar penas, mas sim a documentar o paulatino desenvolvimento conceitual de categorias jurídicas, que ocorre no interior de um complexo sistema de interação entre a legislação, a jurisprudência e a ciência jurídica de um determinado país.”
No trabalho, isso foi traduzido em “alterar substancialmente” os conceitos e autor e partícipe. No código em vigor, há “fricção” entre a lei e a Constituição. No projeto de reforma, há “defeitos insuportáveis”, diz Leite.
“Explicando de forma imprecisa: hoje o Código Penal diz que todos aqueles que participam do delito, de qualquer forma, são autores, sem diferenciar níveis qualitativos de participação”, afirma o professor. A principal mudança sugerida pelo texto alternativo é na individualização de condutas, que deve prever o nível de envolvimento e participação de réus e investigados nos crimes.
Outro problema, segundo ele, é a transferência de responsabilidade, prevista no artigo 30. Cita como exemplo o crime de peculato, que só pode ser cometido por funcionários públicos, mas, se ficar comprovado que particulares contribuíram com o cometimento do crime, também serão processados como autores.
“O princípio da legalidade leva à ideia de que a lei penal deve ser o mais preciso possível e a responsabilização deve ser individual. Não devem existir formas de imputação por comportamento de terceiros, porque a Constituição não prevê a transferência de responsabilidade”, explica Alaor Leite.
A resposta foi dada no projeto de reforma do Código Penal, mas veio cheia de “defeitos insuportáveis”, diz o projeto alternativo de reforma da Parte Geral. Entre eles, por exemplo, a previsão da teoria do domínio do fato já na Parte Geral. Isso faria com que essa construção doutrinária pudesse ser aplicada a todo e qualquer crime, e não apenas aos crimes de corrupção, como definiu o Supremo no mensalão.
Os professores também excluíram da Parte Geral a previsão de responsabilização penal de pessoas jurídicas. Alaor Leite afirma que essa é a tendência mundial em Direito Penal, mas não pode ser feita da forma lacônica como querem os parlamentares. “Entendemos que a Parte Geral é feita para pessoas naturais, e não para empresas. Hoje, empresas só respondem por delitos ambientais. Se querem mudar isso, devem editar leis especiais”, comenta o professor.
Alaor Leite acredita que esse tipo de erro seja produto do tamanho da ambição do projeto. A comissão de juristas para reformar o Código Penal foi anunciada em 2012, numa época em que diversos códigos estavam sendo reformados. O Código de Processo Civil veio dali, mas também foram formadas comissões para reformar o Código Eleitoral, o Código Comercial, o Código de Defesa do Consumidor e o Código de Processo Penal.
“Nada contra a ideia de unificar e codificar a legislação penal. É uma ideia muito boa. Mas também muito ambiciosa, muito delicada. Para se reformar um código do zero, é preciso discussão técnica e debate amplo com a sociedade, e não houve nada disso com esse projeto. Acredito que, neste caso, tenha havido certo deslumbramento com o tamanho da missão, e todos foram vítimas dessa euforia. O que estamos tentando agora é trazer sobriedade para o debate”, afirma Alaor Leite.
Clique aqui para ler a proposta alternativa para a Parte Geral.
A ideia surgiu porque o projeto de reforma tem “defeitos insuportáveis” em sua Parte Geral, conforme explicam os autores na introdução ao trabalho, assinado pelos professores Luís Greco, Frederico Horta, Alaor Leite, Adriano Teixeira e Gustavo Quandt.
Esses defeitos foram expostos no livro Reforma Penal: a crítica científica à Parte Geral do Projeto de Código Penal, coordenado por Alor Leite e com textos de todos os autores do projeto alternativo.
Em entrevista à ConJur, Leite explica que a Parte Geral do Código Penal é a espinha dorsal da lei, a “fundação do prédio”. Portanto, erros nesse trecho comprometeriam todo o sistema penal brasileiro. Caso aprovado, o projeto põe em risco de inconstitucionalidade toda a estrutura penal do país, que é exatamente o que o projeto pretendia consertar e adequar à Constituição Federal quando foi anunciado, em 2012, lembra o professor, assistente científico na Universidade de Augsburg, na Alemanha.
O projeto em discussão no Senado, diz a introdução ao texto alternativo, “padece de irrecuperáveis defeitos sistemáticos, agravados pelo excesso de alterações aleatórias a que se procedeu ao longo dos últimos conturbados cinco anos”.
Entre os problemas, os professores apontam a previsão de crimes e penas já na Parte Geral. “Esse setor do Código não se presta a prever crimes e cominar penas, mas sim a documentar o paulatino desenvolvimento conceitual de categorias jurídicas, que ocorre no interior de um complexo sistema de interação entre a legislação, a jurisprudência e a ciência jurídica de um determinado país.”
Questões de autoria
Alaor Leite conta que o foco principal do trabalho foi adaptar a Parte Geral do Código Penal à Constituição Federal, já que a última reforma nesse trecho aconteceu com a Lei 7.209/1984. Princípios constitucionais importantes surgiram no Brasil em 1988, explica o professor, especialmente os da legalidade e da culpabilidade.No trabalho, isso foi traduzido em “alterar substancialmente” os conceitos e autor e partícipe. No código em vigor, há “fricção” entre a lei e a Constituição. No projeto de reforma, há “defeitos insuportáveis”, diz Leite.
“Explicando de forma imprecisa: hoje o Código Penal diz que todos aqueles que participam do delito, de qualquer forma, são autores, sem diferenciar níveis qualitativos de participação”, afirma o professor. A principal mudança sugerida pelo texto alternativo é na individualização de condutas, que deve prever o nível de envolvimento e participação de réus e investigados nos crimes.
Outro problema, segundo ele, é a transferência de responsabilidade, prevista no artigo 30. Cita como exemplo o crime de peculato, que só pode ser cometido por funcionários públicos, mas, se ficar comprovado que particulares contribuíram com o cometimento do crime, também serão processados como autores.
“O princípio da legalidade leva à ideia de que a lei penal deve ser o mais preciso possível e a responsabilização deve ser individual. Não devem existir formas de imputação por comportamento de terceiros, porque a Constituição não prevê a transferência de responsabilidade”, explica Alaor Leite.
Vácuos punitivos
Esse tipo de conflito levou ao acórdão da Ação Penal 470, o processo do mensalão, julgada em 2012 pelo Supremo Tribunal Federal. Como não havia formas legais de separar autores de partícipes, a acusação recorreu à teoria do domínio do fato para responsabilizar os acusados, afirma o professor. “Ali havia lacunas de punibilidade, com sujeitos que participaram do delito, mas não se podia avaliar a participação deles. Por isso a teoria do domínio do fato foi usada para criar teorias de responsabilização de acordo com as posições dos réus.”A resposta foi dada no projeto de reforma do Código Penal, mas veio cheia de “defeitos insuportáveis”, diz o projeto alternativo de reforma da Parte Geral. Entre eles, por exemplo, a previsão da teoria do domínio do fato já na Parte Geral. Isso faria com que essa construção doutrinária pudesse ser aplicada a todo e qualquer crime, e não apenas aos crimes de corrupção, como definiu o Supremo no mensalão.
Os professores também excluíram da Parte Geral a previsão de responsabilização penal de pessoas jurídicas. Alaor Leite afirma que essa é a tendência mundial em Direito Penal, mas não pode ser feita da forma lacônica como querem os parlamentares. “Entendemos que a Parte Geral é feita para pessoas naturais, e não para empresas. Hoje, empresas só respondem por delitos ambientais. Se querem mudar isso, devem editar leis especiais”, comenta o professor.
Alaor Leite acredita que esse tipo de erro seja produto do tamanho da ambição do projeto. A comissão de juristas para reformar o Código Penal foi anunciada em 2012, numa época em que diversos códigos estavam sendo reformados. O Código de Processo Civil veio dali, mas também foram formadas comissões para reformar o Código Eleitoral, o Código Comercial, o Código de Defesa do Consumidor e o Código de Processo Penal.
“Nada contra a ideia de unificar e codificar a legislação penal. É uma ideia muito boa. Mas também muito ambiciosa, muito delicada. Para se reformar um código do zero, é preciso discussão técnica e debate amplo com a sociedade, e não houve nada disso com esse projeto. Acredito que, neste caso, tenha havido certo deslumbramento com o tamanho da missão, e todos foram vítimas dessa euforia. O que estamos tentando agora é trazer sobriedade para o debate”, afirma Alaor Leite.
Clique aqui para ler a proposta alternativa para a Parte Geral.
Fonte: Conjur