Justiça nega pedido do MP para médico pagar R$ 12 mil a Shantal

Via @portalg1 | A Justiça negou a proposta do Ministério Público de São Paulo para que a queixa-crime aberta pela influenciadora Shantal Verdelho contra o médico obstetra Renato Kalil fosse encerrada com o pagamento de R$ 12 mil em indenização.

Ao g1, a defesa de Shantal explicou que a queixa-crime é uma ação penal privativa referente aos crimes de injúria e difamação. Ela foi aberta em maio deste ano para denunciar os xingamentos feitos por Kalil à Shantal durante parto da filha dela, em 2021.

Além dessa ação, o médico é investigado por violência obstétrica. Em agosto, Kalil admitiu em depoimento à polícia que usou "palavras inadequadas" durante o parto, mas alegou que as falas foram "apenas em um momento de incentivo motivacional". Ele nega ter cometido violência obstétrica (veja mais abaixo).

"Para os crimes de ofensa é preciso entrar com ação penal privada e, por isso, entramos com queixa-crime. A lei estabelece que o acusado, com bons antecedentes, possa fazer uma transação ao estado em vez de enfrentar o processo. E foi isso que o Ministério Público ofereceu, porque é lei. Porém, embora ele tenha direito, fomos contra", afirmou o advogado Sergei Cobra.

A audiência referente à ação penal privada foi realizada no dia 1º de setembro. O juiz vetou a proposta de indenização feita pelo MP, alegando que o médico "ostenta grande poder aquisitivo e visibilidade", e o valor não representaria "paridade ou equilíbrio".

Foi determinado, então, que o MP se pronuncie sobre a possibilidade de uma nova proposta, como novo valor e nova audiência.

O g1 entrou em contato com a defesa de Renato Kalil, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem. A reportagem também aguarda posicionamento do Ministério Público.

Interrogatório

Médico Renato Kalil é acusado de abuso sexual e violência obstetrícia — Foto: Reprodução

Renato Kalil é investigado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público de São Paulo após ter sido denunciado por violência obstétrica.

Em depoimento, no mês de agosto, ele afirmou que "se errou, foi apenas 'verbalizando duas ou três palavras' e nada mais, pois todo o restante do seu trabalho foi correto".

Os abusos, segundo a denúncia, ocorreram durante o parto da filha de Shantal em setembro de 2021, no Hospital e Maternidade São Luiz, na cidade de São Paulo.

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A GloboNews teve acesso ao conteúdo do interrogatório, prestado no dia 4 de agosto no 27º Distrito Policial de São Paulo, na Zona Sul da capital paulista. Esta foi a primeira vez em que o médico foi ouvido formalmente.

No início do depoimento, Renato Kalil afirmou que a influenciadora o procurou por indicações de outras amigas, que também eram pacientes dele, e que a relação com Shantal era "superamigável" e "de intimidade".

Questionado pelo delegado Eduardo Luis Ferreira sobre o passo a passo do parto, o obstetra relatou que, mesmo com a dilatação adequada para o nascimento normal e encaixada, sem a necessidade de cirurgia, a criança estava com o "polo cefálico na posição transversa" e que "em momento algum indicou a episiotomia, muito embora tenha conversado antes do parto várias vezes sobre esse assunto com Shantal, pois esse procedimento pode eventualmente ser necessário para evitar a ocorrência de graves lacerações na região vaginal da mulher".

A episiotomia é uma incisão cirúrgica do períneo e da parede vaginal feita durante o parto, geralmente realizada para aumentar rapidamente a abertura para a passagem do bebê. Segundo o médico, Shantal recusou a episiotomia e houve lacerações de grau 2, que foram suturadas logo em seguida.

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Questionado pela Polícia Civil se chamou o marido de Shantal para mostrar as lesões e se ele se recordaria das palavras que usou, Kalil afirmou que, logo após Mateus entregar Domênica para Shantal, chamou o pai, como sempre faz com os acompanhantes, para mostrar as lacerações e, em seguida, após realizar a sutura, "chamou-o novamente para mostrar que tudo estava ok".

Renato Kalil disse ainda que apenas mostrou a ele o procedimento e que se recorda que as palavras ditas foram apenas para mostrar-lhe onde teriam ocorrido as lacerações.

O relato contraria o que Shantal disse em áudio de conversa íntima vazada nas redes sociais. Na conversa, a influencer acusa Kalil de usar palavrões contra ela durante o parto e expor sua intimidade para o pai da criança durante o procedimento e também para terceiros.

"Ele chamou meu marido e falou: 'Olha aqui, toda arrebentada. Vou ter que dar um monte de pontos na perereca dela'. Ele falava de um jeito como 'olha aí, onde você faz sexo, tá tudo fodido'. Ele não tinha que fazer isso. Ele nem sabe se eu tenho tamanha intimidade com meu marido", contou.

"Quando a gente assistia ao vídeo do parto, ele me xinga o trabalho de parto inteiro. Ele fala 'Porra, faz força. Filha da mãe, ela não faz força direito. Viadinha. Que ódio. Não se mexe, porra'... depois que revi tudo, foi horrível", comentou a influencer no áudio vazado.

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Já o obstetra afirmou em depoimento que não assistiu aos vídeos gravados durante o parto pelo marido da influenciadora, divulgados no fim do ano passado.

Sobre as gravações, disse apenas que, quando se dirigiu com o nome de "viadinha", quis se referir à dificuldade de redução da bexiga que estava inchada, salientando que estava conversando com ele mesmo e que "em momento algum teve a intenção de constranger a paciente".

Em outro trecho do interrogatório, Kalil também negou que tenha pedido ao médico anestesista e à médica auxiliar a realização da manobra de Kristeller, contraindicada pelo Ministério da Saúde a partir do segundo período do trabalho de parto.

Perícia de gravação e tipificação

A investigação policial também solicitou perícia do vídeo gravado por uma câmera do marido de Shantal durante o parto e um exame para constatar se houve lesão corporal contra a paciente por causa de alguma prática ilegal no procedimento.

Mais de 20 testemunhas de acusação já foram ouvidas na fase de inquérito policial. Entre elas estão funcionárias da equipe de Kalil e ex-pacientes.

A GloboNews apurou que os depoimentos indicaram a prática de violência obstétrica durante consultas e partos realizados pelo obstetra, além de outros crimes - como assédio sexual e importunação sexual.

Como a violência obstétrica não é tipificada como infração penal, a Polícia Civil pode relatar o inquérito por lesão corporal e violência psicológica, por exemplo, e oferecer denúncia ao Ministério Público (MP-SP).

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Caberá ao MP-SP decidir se irá oferecer denúncia à Justiça e por quais crimes, ou se pedirá mais diligências e/ou depoimentos à polícia. A Promotoria de Violência Doméstica do Foro Central da capital paulista acompanha o caso desde a abertura do inquérito policial e também instaurou Procedimento Investigatório Criminal (PIC) para ouvir vítimas.

Em nota, o Hospital São Luiz informou que "o médico em questão não está autorizado a realizar partos na instituição durante a investigação" e que "o caso foi encaminhado pela Comissão de Ética ao Conselho Regional de Medicina".

Já o Conselho Regional de Medicina (Cremesp), afirmou, também por nota, que "as investigações seguem em andamento e que correm sob sigilo determinado por Lei. Qualquer posicionamento adicional do Conselho em relação ao ocorrido pode resultar na nulidade da apuração".

Por Paola Patriarca, g1 SP

Fonte: g1

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