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Até o momento, ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Edson Fachin e Gilmar Mendes acompanharam, integralmente, o relator, ministro Dias Toffoli.
Ministro Flávio Dino também o acompanhou na maior parte do voto, no entanto, fez ressalva com relação à execução extrajudicial por meio do Detran. Para Dino, o art. 8º-E da norma é inconstitucional ao delegar atos de constrição patrimonial a órgãos administrativos e empresas privadas sem controle judicial.
Ministra Cármen Lúcia divergiu. Para S. Exa., os procedimentos extrajudiciais previstos na lei violam garantias fundamentais como o devido processo legal, a inviolabilidade do domicílio e a cláusula de reserva de jurisdição.
O julgamento ocorre no plenário virtual e os ministros têm até as 23h59 desta segunda-feira, 30, para proferirem votos, pedirem vista ou destaque das ações.
Entenda
As ADIns foram ajuizadas pela União dos Oficiais de Justiça do Brasil, pela Associação dos Magistrados Brasileiros e pela Associação Nacional dos Oficiais de Justiça, Avaliadores Federais e Associação Federal dos Oficiais de Justiça do Brasil.
Elas questionam os arts. 8º-B a 8º-E do decreto-lei 911/69, com a redação dada pela lei 14.711/23. Eles preveem:
• Consolidação extrajudicial da propriedade fiduciária por meio de cartório;
• Procedimento de busca e apreensão administrativa;
• Regras para execução extrajudicial de hipotecas e garantias em concurso de credores;
• Possibilidade de realização de leilões extrajudiciais e alienação direta.
As entidades sustentam que tais medidas violam a reserva de jurisdição, o devido processo legal, a inviolabilidade de domicílio e o princípio da dignidade da pessoa humana, ao permitirem constrição de bens sem autorização judicial.
Em agosto de 2024, o procurador-Geral da República, Paulo Gustavo Gonet Branco, emitiu parecer defendendo a constitucionalidade do marco legal das garantias. O PGR pediu a improcedência das ações diretas de inconstitucionalidade, afirmando que as normas da lei garantem o devido processo legal e respeitam o direito de propriedade, sem impedir o acesso ao Judiciário.
Voto do relator
O relator, ministro Dias Toffoli, reconheceu a constitucionalidade dos procedimentos extrajudiciais, ao afirmar que a atuação de cartórios e instituições administrativas não exclui o controle judicial posterior, conforme assegurado pela CF.
Segundo Toffoli, a execução extrajudicial é facultativa e depende de cláusula expressa no contrato.
O procedimento, além de assegurar notificação do devedor e oportunidade para impugnar a cobrança, não elimina o direito de recorrer ao Judiciário. Assim, não há ofensa ao art. 5º, XXXV, da CF, que garante a inafastabilidade da jurisdição.
Quanto à busca e apreensão, o ministro destacou que os dispositivos não autorizam o ingresso forçado em domicílios, nem uso de força por particulares. A apreensão pode ocorrer apenas por meios administrativos, como o bloqueio eletrônico de circulação de veículos, ou por entrega voluntária do bem.
Toffoli também rechaçou a alegação de que as normas violariam o direito à propriedade ou ao devido processo legal, ressaltando que as garantias constitucionais permanecem resguardadas no novo modelo.
A execução extrajudicial, segundo o relator, moderniza o sistema de crédito, reduz a judicialização e estimula a eficiência econômica, ao conferir mais celeridade na recuperação de garantias sem sacrificar os direitos dos devedores.
Contudo, o relator votou por conferir interpretação conforme à Constituição a alguns trechos da lei, especialmente quanto à apreensão do bem.
Determinou que os atos extrajudiciais devem respeitar direitos fundamentais do devedor, como a vida privada, honra, imagem, inviolabilidade do domicílio e proibição do uso privado da violência.
Ao final sugeriu a seguinte tese de julgamento:
"1. São constitucionais os procedimentos extrajudiciais instituídos pela Lei nº 14.711/23 de consolidação da propriedade em contratos de alienação fiduciária de bens móveis, de execução dos créditos garantidos por hipoteca e de execução da garantia imobiliária em concurso de credores.
2. Nas diligências para a localização do bem móvel dado em garantia em alienação fiduciária e em sua apreensão, previstas nos §§ 4º, 5º e 7ºdo art. 8º-C do Decreto-Lei nº 911/69 (redação da Lei nº 14.711/23), devem ser assegurados os direitos à vida privada, à honra e à imagem do devedor; a inviolabilidade do sigilo de dados; a vedação ao uso privado da violência; a inviolabilidade do domicílio; a dignidade da pessoa humana e a autonomia da vontade."
• Veja o voto do relator.
Ressalvas
Ministro Flávio Dino concordou com a maior parte do voto do relator, citando precedentes do STF que já validaram a execução extrajudicial em garantias hipotecárias (tema 249) e em contratos com alienação fiduciária de imóveis (tema 982).
Para S. Exa., esses procedimentos não afrontam a CF, desde que assegurado o acesso ao Judiciário e respeitado o contraditório na esfera administrativa.
A divergência surgiu quanto ao art. 8º-E, que autoriza a execução extrajudicial de veículos por meio do Detran e empresas privadas credenciadas. Segundo Dino, esse modelo compromete a segurança jurídica e os direitos do devedor, pois os Detran não é fiscalizado pelo Judiciário e não possui prerrogativas jurídicas para garantir autenticidade e legalidade dos atos.
O ministro destacou que, ao contrário dos cartórios - cujos oficiais são profissionais do Direito e investidos por concurso -, o Detran apenas processa formalmente os pedidos. A contestação da dívida é feita diretamente ao credor, que decide unilateralmente pelo prosseguimento da execução e pode, inclusive, requisitar apoio policial para apreensão do veículo.
Para Dino, essa sistemática concentra poder no credor e elimina qualquer instância de controle sobre os atos, inclusive a possibilidade de defesa prévia perante autoridade pública. Assim, votou por declarar a invalidade do art. 8º-E e parágrafo único.
Nos demais pontos, acompanhou o relator na interpretação, conforme a Constituição dos §§ 4º, 5º e 7º do art. 8º-C, reforçando a proteção à dignidade da pessoa humana e aos direitos fundamentais do devedor.
• Veja o voto.
Divergência
Para ministra Cármen Lúcia, os procedimentos extrajudiciais de consolidação da propriedade, busca e apreensão de bens móveis, e execução de hipotecas e garantias imobiliárias violam direitos e garantias fundamentais assegurados pela CF.
Em voto, a ministra sustentou que as normas impugnadas contrariam o devido processo legal (art. 5º, LIV), a inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI), e a reserva de jurisdição - cláusula que exige ordem judicial para atos como a busca e apreensão de bens. Criticou especialmente a possibilidade de diligências realizadas por empresas privadas sem controle judicial.
Segundo Cármen, permitir que oficiais de cartório ou agentes privados pratiquem atos típicos de coerção estatal configura "desjudicialização indevida de garantias constitucionais".
A seu ver, a CF não admite que medidas que afetem a propriedade ou a posse sejam tomadas sem a devida supervisão judicial.
A ministra reconheceu que a Corte já validou, em outros momentos, procedimentos extrajudiciais - como na execução hipotecária do SFH (tema 249) e da alienação fiduciária de imóveis (tema 982). Contudo, reiterou a posição vencida nesses julgados, reafirmando que tais procedimentos ferem o direito de defesa e o devido processo legal ao restringirem o acesso imediato à Justiça.
S. Exa. também citou precedentes do STF que reconhecem a reserva de jurisdição para medidas de indisponibilidade de bens e de busca e apreensão, como nas ADIns 1.668 e 5.881. Afirmou que, mesmo sob a justificativa de desburocratização, não se pode esvaziar o papel do Poder Judiciário.
Cármen Lúcia votou pela procedência total das ações, declarando inconstitucionais os arts. 6º, 9º e 10 da lei 14.711/23 - que introduzem os arts. 8º-B a 8º-E no decreto-lei 911/69 e regulam as execuções extrajudiciais. Para S. Exa., tais dispositivos atentam contra a CF ao permitirem medidas de constrição patrimonial sem decisão judicial.
Confira o voto da ministra.
• Processos: ADIns 7.600, 7.601 e 7.608.
Da Redação
Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/433681/stf-forma-maioria-para-validar-busca-e-apreensao-extrajudicial-de-bens