Os ministros acataram o argumento de que houve cerceamento da defesa de Adriana Villela porque parte dos depoimentos colhidos pela polícia só foi apresentada durante o julgamento.
A maioria foi formada em torno do voto do ministro Sebastião Reis Júnior – que divergiu do relator do caso.
"A defesa não teve acesso, antes do julgamento em Plenário, às mídias contendo os depoimentos dos corréus Leonardo, Paulo e Francisco — vídeos dos depoimentos prestados em delegacia. [...] Os depoimentos extrajudiciais dos corréus foram determinantes para justificar a autoria do crime", disse o ministro em seu voto.
A decisão deve anular, além da condenação, todos os atos da Justiça a partir do recebimento da denúncia em 2010 – incluindo produção de provas, coleta de depoimentos e o próprio júri popular.
Com a anulação, o caso volta às mãos de um juiz de primeira instância, que poderá revalidar parte desse material anulado, determinar novas diligências e, ao fim, decidir se convoca um novo júri popular para esse processo.
Os limites exatos dessa anulação deverão constar no acórdão – que será elaborado pelo ministro Sebastião Reis Júnior, já que a divergência aberta por ele saiu vencedora.
O placar final no STJ ficou assim:
• 3 votos para anular a condenação do júri e todos os atos desde a instrução: ministros Sebastião Reis Júnior, Antônio Saldanha Palheiro e desembargador Otávio Toledo.
• 2 votos para manter a condenação e determinar a prisão imediata de Adriana Villela: ministros Rogério Schietti Cruz (relator), Og Fernandes.
Condenação cancelada
Adriana Villela tinha sido condenada por três assassinatos:
• do pai, o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela;
• da mãe, Maria Villela;
• e da empregada da família, Francisca Nascimento.
As mortes aconteceram em agosto de 2009 – e completaram 16 anos no último fim de semana.
Em 2019, o tribunal do júri sentenciou Adriana Villela a 67 anos e 6 meses de reclusão pelo assassinato das três pessoas. A pena foi definida em 67 anos e 6 meses em 2019 e, em segunda instância, reduzida para 61 anos e 3 meses em 2022.
Com a nova decisão, Adriana Villela não cumprirá essa pena, e o caso voltará à etapa inicial de julgamento.
Os votos desta terça
• Og Fernandes
Nesta terça, Og Fernandes foi o primeiro a votar – por ter sido ele quem pediu prazo extra. O magistrado acompanhou a posição do relator.
Ao analisar o argumento da defesa de que não teria tido acesso a depoimentos de testemunhas em tempo hábil, o ministro afirmou que a própria defesa usou esses depoimentos durante o tribunal do júri – e que a contestação da falta de tempo só foi feita após a condenação.
Na prática, Og Fernandes avaliou que a defesa não questionou essa falta de acesso em tempo hábil.
"Essa mesma insurgência foi induzida apenas na petição de apelação. Como assinalado no voto do ministro relator, 'a jurisprudência dessa Corte evoluiu para considerar que, no processo penal, mesmo as nulidades absolutas exigem prejuízo e estão sujeitas à preclusão'".
• Antônio Saldanha Palheiro
Em menos de cinco minutos, o ministro seguiu a divergência e votou para anular o tribunal do júri e a condenação.
"É um caso de extrema gravidade, com diversas oscilações em termos de apuração de autoria, processuais, procedimentais, interferências de agentes polícias que não tinham competência ou atribuição […] Esse processo é de uma conturbação extrema, então até por isso deveria ocorrer um julgamento estreito."
• Otávio de Almeida Toledo, desembargador convocado
Em um voto também rápido, o desembargador Otávio de Almeida Toledo desempatou o placar e decidiu pela anulação do júri.
Globoplay mostrou depoimentos
Os vídeos dos depoimentos dos executores do crime foram gravados em 2010 na Corvida, a antiga Coordenação de Repressão de Crimes contra a Vida.
No entanto, segundo o processo, só foram disponibilizados aos advogados de Adriana em 29 de setembro de 2019, próximo do final do júri dela.
📌 Os vídeos desses depoimentos foram exibidos em primeira mão no documentário "Crime da 113 Sul", lançado pelo Globoplay em fevereiro deste ano.
O que dizia a defesa de Adriana Villela?
Ao longo do processo, a defesa tem apontado que Adriana Villela é inocente.
Quando do julgamento pelo júri, por exemplo, afirmaram que a condenação ocorreu sem provas da participação dela. Na segunda instância, a defesa voltou a declarar que ela não cometeu crime.
No recurso ao STJ, a defesa de Villela argumentou que a condenação dela ocorreu sem a devida comprovação de autoria do delito e que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária à prova constante no processo. Pediram, assim, a anulação do veredito do júri.
O que dizia o Ministério Público?
Em manifestação ao Superior Tribunal de Justiça, o Ministério Público do Distrito Federal pediu a execução imediata da pena de Adriana Villela.
O MP do DF argumentou que não há, no recurso da defesa, questões que possam levar à anulação da condenação. Também sustentou que já há o aval do STF para que, em condenações do júri, a execução da pena já seja realizada, mesmo na pendência de recursos.
Também citando a decisão do STF, o Ministério Público Federal defendeu o cumprimento de pena.
Ainda cabem novos recursos?
A decisão tomada pela Sexta Turma ainda pode ser alvo de recurso. É possível, por exemplo, recorrer dentro do próprio STJ, com embargos de declaração - pedidos de esclarecimentos de pontos do que for definido pelos ministros.
Se houver questões constitucionais, também é possível acionar o Supremo Tribunal Federal.
Por Ana Lídia Araújo, Fernanda Bastos, Reynaldo Turollo Jr, Márcio Falcão, g1 e TV Globo — Brasília
Fonte: g1