Para delimitar ainda mais o tema objeto do presente artigo: imagine-se que o pedido de remoção se volte contra conteúdo de caráter jornalístico, ou mesmo crítico a respeito de certa conduta praticada por pessoa pública. O mais provável é que o debate recaia sobre a necessidade de balanceamento entre os direitos fundamentais relacionados à liberdade de expressão e aqueles relacionados à honra, imagem e privacidade do indivíduo envolvido.
Mas, e os efeitos práticos e, em certas situações, de certo modo até perversos, da veiculação de pedido nesse sentido? A respeito disso, pouquíssimo se debate. Pretende-se, ao final da presente exposição, demonstrar que tal postura pode se mostrar equivocada.
Um caso prático: Barbra Streisand, personalidade famosa por seu talento enquanto atriz, cantora e compositora, agora também empresta seu nome ao efeito inverso que um pedido de remoção de conteúdo inserto na internet pode carregar. A notícia da existência de um processo judicial promovido contra fotógrafo que inseriu, em álbum virtual de imagens da Costa da Califórnia, fotografia em que constante a mansão da atriz, foi capaz de fazer com que mais de 420 mil pessoas visualizassem referida imagem no mês seguinte[1].
Os exemplos podem facilmente ser trazidos para o âmbito nacional. A insistência em pedidos de remoção de conteúdo na internet fez com que o candidato Aécio Neves fosse personagem inclusive de editorial publicado pela Folha de S.Paulo. O título é verdadeiramente emblemático: De Minas a Pequim[2]. A derrota da atual presidente da República na representação eleitoral em que se pretendia a remoção de opiniões econômicas divulgadas por consultoria repercutiu em um número incontável de publicações, sendo compartilhada 420 vezes somente pelos leitores do ConJur[3].
A surpreendente quantidade de pedidos que revelam, na realidade, uma incapacidade de se debater na arena pública fez com que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) lançasse, em conjunto com diversos órgãos de imprensa, o portal Eleição Transparente. Trata-se de um “monitor com dados sobre ordens judiciais contra publicação de conteúdo[4]”, que divulga, em tempo real, a quantidade representações eleitorais em que se pretende a remoção de conteúdo inserido na internet. Há, inclusive, um ranking, em que elencados os candidatos que mais apresentaram pedidos judiciais de remoção[5].
A verdade é que certas tentativas de esconder — com o perdão de eventual excesso de estilo — podem culminar por ressaltar ainda mais existência de certo conteúdo, por vezes singelo e inofensivo, inserido na internet. Há casos em que, obviamente, a remoção representa a medida que mais se alinha aos ditames estatuídos pela Constituição Federal brasileira. O que parece existir, todavia, é uma aparente ausência de cautela na veiculação de certos pedidos, que podem revelar, em última análise, uma tentativa velada de censura.
A situação pode se mostrar ainda mais delicada quando o que se pretende é impossibilitar que certo endereço virtual possa ser descoberto por intermédio da utilização de ferramentas de busca, tais como o Search, da Google, e o Bing, da Microsoft. O fato[6] é que o Superior Tribunal de Justiça vem consolidando entendimento no sentido de que impossibilitar o acesso a certo conteúdo no âmbito dos mecanismos de busca representa medida inútil para o fim a que se dirige[7]. Aqui, trazendo a investigação para o âmbito jurídico, há carência de ação por ausência de interesse de agir. Desconhecer o referido entendimento pode ser traumático a quem pretenda fazer valer seu hipotético direito à privacidade.
Muito mais do que problematizar e apresentar conclusões profundas e abalizadas a respeito do tema — certamente inalcançáveis pelos autores —, a intenção do presente artigo foi a de realçar certos pontos que a marginalidade do argumento pragmático no dia a dia forense pode ser capaz esconder. Tal objetivo, modéstia à parte, espera-se tenha sido alcançado.
[1] Maiores informações disponíveis em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Efeito_Streisand e
http://en.wikipedia.org/wiki/Streisand_effect
[2] Conteúdo disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1425910-editorial-de-minas-a-pequim.shtml
[3] Conteúdo disponível em: http://www.conjur.com.br/2014-ago-20/consultoria-anunciar-avaliacoes-dilma-decide-tse
[4] Conteúdo disponível em: http://www.eleicaotransparente.com.br/#/infografico/estado
[5] Conteúdo disponível em: http://www.eleicaotransparente.com.br/ranking
[6] Tal constatação não necessariamente revela a opinião dos autores a respeito do tema
[7] Cite-se, por exemplo: Rcl. 18.685/ES, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 05.08.2014; Rcl 5.072, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Para Acórdão Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, J. 11.12.2013; REsp 1316921/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJe 29.06.2012
Por Francisco de Mesquita Laux e Caio Miachon Tenorio
Fonte: conjur.com.br