Advocacia continua sendo confundida com seus clientes - Por Fábio Romeu Filho

goo.gl/EbcbA8 | Ainda que parcial, uma grande vitória da advocacia foi alcançada em 9 de agosto último, quando a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal aprovou por unanimidade o Projeto de Lei 141/2015, que torna crime a violação das prerrogativas profissionais dos advogados. O trâmite legislativo reserva ainda apreciação do PL pela Câmara dos Deputados. O Brasil está, portanto, a um passo de importante avanço civilizatório.

Não é de hoje que a OAB-SP luta para que esse princípio basilar do Direito — a garantia de exercício profissional pleno àquele que é um dos componentes do tripé da Justiça — seja respeitado e seus violadores punidos por lei. O empenho mais intenso nesse sentido começou na primeira gestão de Luiz Flávio Borges D’Urso à frente da seccional Paulista da Ordem, em 2004, e prosseguiu com a mesma contundência nas suas duas administrações seguintes e nas do atual presidente, Marcos da Costa. Com o abraço à causa pelo Conselho Federal da OAB e o engajamento do presidente Cláudio Lamachia, a advocacia está prestes a conquistar o êxito legislativo almejado.

A vitória absoluta, contudo, não depende apenas do Congresso Nacional. Carece de um esforço contínuo por parte de toda a classe, exercido no dia a dia, para reversão de um enraizado preconceito. Se juízes, delegados, procuradores, burocratas ou qualquer autoridade a partir de agora pensarão três vezes antes de cercear o trabalho do advogado, parcela significativa da população — a maioria? — ainda enxerga esse profissional como espelho do cliente, principalmente em causas criminais.

Para potencializar essa visão distorcida, conta-se com ajuda decisiva da mídia, ou de parcela dela. No dia em que a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o PL das Prerrogativas, telejornais noturnos alertavam para “os riscos” que isso traria ao país. Repórteres e analistas inseriam a votação por 15 a zero na CCJ entre as ações coordenadas para inibir a operação “lava jato”. Como é possível tamanha falta de rigor jornalístico? Ninguém pensou em puxar o histórico da luta pelo respeito às prerrogativas da advocacia? Não se pensou em verificar como se dá a prática da advocatícia em outros países? Seriam os interesses relacionados com a Operação Lava Jato onipotentes ao ponto de ditar o resultado de um pleito muito anterior a eles?

Prevalece hoje no Brasil o raciocínio binário, tendo como fiel da balança a operação “lava jato”: quem não subscreve todas as condutas da dita força-tarefa está ao lado dos corruptos. Há que se ter coragem e afirmar que, sim, prerrogativas de advogados são violadas diariamente tanto na famigerada — e bem-vinda! — operação quanto em tantas outras, tanto quanto nos fóruns criminais, cíveis ou trabalhistas, tanto quanto nas delegacias.

Não é coibindo ou ridicularizando a advocacia que se vencerá a sistêmica corrupção nativa. É irritante quando o âncora do telejornal mal disfarça uma risada irônica após pronunciar o advogado do réu famoso. O que está por traz desse sorriso de Mona Lisa? Uma vontade incontrolável de ver o réu condenado? Ora, jornalistas deveriam saber que a concretização da justiça deve seguir um caminho legal, e que esse caminho pode levar não exatamente aonde se gostaria.

A sociedade brasileira compreenderá, um dia, por que o advogado deve ser inviolável em seu exercício profissional. Não tardará, ninguém mais aplaudirá juízes que cerceiam a palavra de defensores. Burocratas não dificultarão vistas de processos, seguranças não submeterão advogados a revistas vexatórias à entrada dos fóruns. Escritórios de advocacia nunca mais serão invadidos e devassados. Tudo isso está prestes a se tornar crime, mas a mudança mais relevante, a cultural, talvez demore um pouco mais.

Profissional da coragem, o advogado deve ele próprio ser agente dessa transformação. Quem advoga está obrigado a lutar pelo respeito às prerrogativas profissionais, cujo destinatário é o próprio cidadão. A timidez e o medo não combinam com o exercício pleno da advocacia. O advogado deve ser o protagonista dessa incessante batalha por seus direitos, que são, enfim, os direitos do cidadão.

Por Fábio Romeu Canton Filho
Fonte: Conjur

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