O projeto de lei 4/2025, de autoria de Rodrigo Pacheco, pretende modificar mais de mil artigos do regramento atual, fazendo mudanças sensíveis nas relações familiares, indo desde o próprio conceito de família até processos como o casamento, o divórcio e a herança.
O novo Código Civil legitima, por exemplo, a união homoafetiva — os casamentos entre pessoas do mesmo sexo são permitidos por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), mas não estão na legislação brasileira.
Quanto aos filhos, o texto prevê registro imediato de paternidade quando o pai recusar o exame de DNA e impõe regras mais rígidas para a reprodução assistida — além de proibir a "barriga de aluguel", ou seja, a cessão temporária do útero pela mulher em troca de benefícios financeiros.
A proposição retira ainda o cônjuge como herdeiro caso haja descendentes (filhos e netos) ou ascendentes (pais e avós) e permite o divórcio unilateral sem a necessidade de ação judicial.
Até mesmo os pets, cada vez mais importantes na rotina familiar, foram incluídos nas modificações do Código Civil. Eles passam a ser considerados seres sencientes e passíveis de proteção jurídica.
O Ponto Poder explica o que muda quanto à família e a temas relacionados a ela com o novo Código Civil:
União homoafetiva
Permitida no Brasil desde 2011, a união homoafetiva ainda não era prevista na legislação brasileira.
O novo Código Civil substituiu a expressão "homem e mulher" por "duas pessoas" tanto no capítulo destinado a casamento como no que trata de união estável, igualando assim todos os relacionamentos, hétero ou homoafetivos.
Proteção a todas as famílias
O novo Código Civil terá uma ampliação do conceito de família. Assim, além da família conjugal já prevista, passa a ser definido o vínculo não conjugal — como mãe ou pai solo e filho ou irmã e irmão —, que passa a ser chamado parental.
Fica reconhecido ainda o parentesco por consanguinidade, mesmo em casos de barriga solidária, e o parentesco por socioafetividade. "A inexistência de vínculo genético não exclui a filiação se comprovada a presença de vínculo de socioafetividade", estabelece o projeto de lei.
São feitas ainda outras substituições de termos, como:
• "Entidade familiar" por “família”;
• "companheiro" por "convivente" nos casos de união estável; e
• "poder familiar" por "autoridade parental".
O texto busca garantir ainda o direito à multiparentalidade, o que permite a coexistência de vínculos maternos ou paternos em relação a mesma pessoa. Caso não haja consenso com os genitores naturais, é possível pedir esse reconhecimento judicialmente.
Cônjuges deixam de ser herdeiros
O texto retirou o termo "cônjuge" da lista de "herdeiro necessário" — que engloba todos aqueles de quem não pode ser tirado o direito à herança em caso de morte do familiar. Estão na lista os descendentes, como filhos e netos, e os ascendentes, como pais e avós.
Na justificativa, é citado que, para a elaboração do novo Código Civil, foi preciso "repensar a posição do cônjuge e do companheiro na sucessão legítima".
"Chegando-se à conclusão de que eles não deveriam mais figurar como herdeiros necessários, nem muito menos concorrer com os descendentes e ascendentes do autor da herança", pontua a justificativa.
Os cônjuges continuam a ser herdeiros legítimos, ou seja, ainda podem ser incluídos no testamento. Contudo, esse direito pode ser mais facilmente contestado, o que não é possível no regramento atual.
Na ausência dos descendentes necessários e de testamento, "será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge ou ao convivente sobrevivente", diz o texto do projeto de lei.
Divórcio unilateral
O novo Código Civil estabelece uma nova modalidade de divórcio: o unilateral. Nele, sem a necessidade de ingressar com ação judicial, a pessoa precisa apenas solicitar a separação no cartório em que foi registrada a união do casal.
Uma notificação será enviada ao cônjuge e se, em até cinco dias, ela não for atendida, o divórcio será efetivado.
Hoje, existem três formas de divórcio:
• Consensual;
• judicial, quando há divergência; e
• extrajudicial, feito em cartório com o consenso do casal.
Na justificativa do projeto, é pontuado que essa modificação "resultará em efetiva e concreta desburocratização, porquanto independe da aquiescência da outra parte, dispensando-se até mesmo a lavratura de escritura pública".
Também foi regulado o direito ao divórcio post mortem, ou seja, quando a pessoa ajuizou o pedido de divórcio, mas vem a falecer antes do resultado. A proposta estabelece que o processo não será mais extinto após a morte, caso seja do interesse dos herdeiros. Nestes casos, a sentença retroagirá à data do óbito.
O texto também estabelece uma compensação financeira, no momento do divórcio, ao cônjuge que ficou responsável pelo trabalho doméstico e o cuidado com os filhos. O valor será estabelecido pelo juiz responsável pela análise do caso.
Mudança no regime de bens
Outro processo que pode ser desburocratizado caso o novo Código Civil seja aprovado é o de mudança no regime de bens. A proposta estabelece que essa alteração poderá ser feita em cartório. Hoje, só é permitida com autorização judicial.
Reprodução assistida
O novo Código Civil cria regras para a reprodução assistida no País. Hoje, a situação é regulamentada por meio de resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM), mas não há legislação específica sobre o tema.
A proposição proíbe o uso das técnicas reprodutivas para:
• Fecundar ócitos humanos com qualquer outra finalidade que não o da procriação humana;
• criar seres humanos geneticamente modificados;
• criar embriões para investigação de qualquer natureza;
• criar embriões com finalidade de escolha de sexo, eugenia ou para originar híbridos ou quimeras; e
• intervir sobre o genoma humano com vista à sua modificação, exceto na terapia gênica para identificação e tratamento de doenças graves.
O texto estabelece ainda que é proibida a comercialização de óvulos e espermatozoides, sendo permitida apenas a "doação pura e simples". Os doadores devem permanecer em sigilo, e a escolha para o tratamento caberá apenas ao médico responsável.
A autorização para ter informações sobre o doador será permitida à pessoa fruto do material genético dele apenas com autorização judicial. O mesmo vale para o doador. No entanto, não existirá nenhum vínculo de filiação entre doação e pessoa nascida de seu material genético.
Existe ainda a possibilidade de doação de óvulo, espermatozoide ou embrião após a morte da pessoa, desde que essa tenha deixado autorização por escrito para isso, indicando a quem será destinado essa doação. Neste caso, o doador post mortem terá o vínculo filho e genitor estabelecido juridicamente.
"Barriga de aluguel"
O novo Código Civil autoriza que uma pessoa geste um filho para um casal ou uma pessoa que, por causa natural ou por contraindicação médica, não possa gestar.
Contudo, é proibido a "cessão temporária do útero", como é chamada no texto, com finalidade lucrativa ou comercial — fenômeno mais conhecido como barriga de aluguel.
"A cedente temporária do útero deve, preferencialmente, ter vínculo de parentesco com os autores do projeto parental", continua a proposta, o que é conhecido popularmente por "barriga solidária".
Todo o processo deve ser formalizado por escrito, inclusive com a atribuição sobre quem terá o vínculo de filiação.
Pensão alimentícia na gravidez
O texto amplia a pensão alimentícia para o momento da gravidez, para "contribuir para o sustento do nascituro e da gestante". Não será necessário comprovar a paternidade, apenas indícios suficientes para a decisão do magistrado.
O valor dos chamados alimentos gravídicos será estabelecido de acordo com a necessidade da gestante e das possibilidades do genitor, cobrindo o período que vai desde a concepção até o fim da gestação.
Além da alimentação, o valor deve ser suficiente para cobrir a assistência médica e assistência psicológica. "Com o nascimento, os alimentos serão convertidos integralmente em pensão alimentícia em favor do filho", determina o texto da proposta.
Registro de paternidade
É feita ainda uma mudança quanto ao reconhecimento de paternidade das crianças brasileiras. A mãe irá indicar quem é o genitor, que será notificado pessoalmente. Caso não compareça ao cartório ou recuse o exame de DNA, ele terá o nome imediatamente incluído no registro de nascimento.
"Tal providência impede que mães aguardem meses ou anos o reconhecimento de um vínculo paterno-filial, frequentemente negado por mágoa, desconsideração ou capricho", justifica o texto do projeto de lei.
Ainda é previsto que se o genitor tiver falecido ou não seja possível localizá-lo, o juiz poderá pedir a realização de DNA em parentes consanguíneos.
Proteção aos animais
O novo Código Civil busca garantir proteção jurídica aos animais, que são declarados seres vivos sencientes, ou seja, capazes de ter sensações e emoções.
Fica prevista ainda o compartilhamento de despesas e de companhia entre ex-cônjuges que tinham um ou mais animais de estimação quando em união estável ou casamento.
Escrito por Luana Barros
Fonte: diariodonordeste.verdesmares.com.br